Review 13 Reasons Why – Um tabu chamado suicídio

Existem obras que mexem com os nossos ânimos. Enquanto algumas pessoas recomendam ignorar o último grande sucesso da Netflix, outras seguem o caminho contrário e indicam a série para seus leitores, amigos e familiares. 13 Reasons Why dividiu opiniões e acho que o Cinema de Buteco não pode deixar passar essa oportunidade de comentar sobre a série do momento.

Assim como aconteceu recentemente em Jessica Jones, o trunfo maior da adaptação do livro de Jay Asher está mais na sua proposta do que na sua execução. Exceto pelos primeiros episódios, dirigidos por Tom McCarthy (Spotlight), o restante da série carece de uma narrativa envolvente e ganha o telespectador apenas por contar uma história de fácil identificação, seja você vítima ou agressor.

Os primeiros episódios nos apresentam a personagens adolescentes que deixam o público naquela linha tênue da admiração e irritação. Todos, sem exceção, são egoístas, petulantes, meio tapados e acreditam piamente que são especiais. Essa geração Y é foda. O que acontece é a série transformando os seus protagonistas em crianças ingênuas incapazes de perceberem suas próprias limitações intelectuais (Justin, por exemplo, entra em cena como um conquistador sem nada na cabeça. As suas cenas tentando seduzir Hannah são incríveis, pois mostram toda a sua insegurança quando ouve alguma coisa que não tem a menor ideia do que se trata).

Uma pena que a construção desses personagens de uma forma tão crítica (e cínica) só receba atenção nos episódios iniciais, já que no decorrer da série tudo passa a acontecer no piloto automático sem grandes preocupações narrativas. Felizmente, não é a intenção desse texto ser uma crítica completa de 13 Reasons Why. Quero falar mesmo é sobre esse tabu chamado suicídio e como esse assunto deixa as pessoas tão preocupadas ao ponto de enxergar apenas os defeitos e gatilhos perigosos da série da Netflix.

O restante da coluna possui spoilers! Atenção!

13 reasons why - tabu chamado suicidio

A importância de 13 Reasons Why

Quero explicar porque citei Jessica Jones no começo do texto. Jessica Jones é uma série superestimada pra cacete, cuja relevância está 100% concentrada na sua protagonista humana. Não se trata de uma repetição do senso comum com uma modelo super gostosa seminua detonando vilões, e sim de uma garota normal que precisa superar os traumas de um relacionamento abusivo e seus próprios fantasmas. Isso é do caralho e nunca vou perdoar a Netflix por ter jogado uma premissa tão boa pelo ralo com um roteiro digno das animações dos anos 1970 (dificilmente vou superar as fugas sem nexo do vilão, não adianta!).

13 Reasons Why poderia facilmente se tornar apenas mais uma série superestimada que toca num assunto delicado e que garante atenção por isso. Mesmo me incomodando ao deixar de lado detalhes técnicos que poderiam acrescentar mais para a série, é muito importante ver assuntos sérios como as consequências do bullying na escola, depressão, assédio, exposição excessiva através das evoluções tecnológicas, solidão, e claro, o suicídio receberem um tratamento especial numa produção de sucesso.

Falar desse assunto nunca é fácil, mas é necessário. 13 Reasons Why não me parece uma série que romantiza a ideia de suicídio. É compreensível o medo e preocupação de pais, familiares e professores em ver adolescentes vidrados nela ou se identificando com os dramas vividos pelos personagens. Ninguém quer pensar que aquelas coisas horríveis vistas na ficção realmente aconteçam nas nossas escolas, bem pertinho de nossas casas. O melhor é cortar o assunto usando a justificativa do medo de que a obra influencie quem está passando por um momento difícil.

Assim se estimula a sensação de impunidade de quem contribui para isso divulgando fotos íntimas, atacando ou humilhando constantemente daqueles que estão passando por alguma dificuldade psicológica. É como se apenas o suicida fosse responsável pela sua decisão, que, de fato é, mas a sensação de ver outros envolvidos “escaparem” é revoltante. A série mira exatamente em quem acha que pode fazer qualquer coisa e nunca sentir as consequências.

LEIA TAMBÉM: Review de 13 Reasons Why no blog O Pipoqueiro

13 reasons why - tabu chamado suicidio

É exatamente contra esse tipo de pensamento covarde que a série aponta o dedo.

13 Reasons Why não é uma obra sobre suicidas ou “glamourização da morte”. Ela é uma obra que pressiona as nossas próprias feridas e responsabilidades ao permitir que alguém decida tirar a sua própria vida. É para conscientizar quem fica. É para tentar chocar agressores.

Enquanto começava a assistir, tive um pensamento: agradeci por não frequentar a escola nos dias de hoje. Na minha época, o bullying ficava restrito aos colegas de sala. No máximo para pequenos grupinhos na hora do intervalo. Não existia celular com câmera ou redes sociais para transformar a vida de ninguém num inferno.

Hoje em dia, qualquer coisa ganha uma proporção imensa na internet. A maldade inconsequente (e às vezes até inconsciente) dos jovens tende a potencializar sua força agora que todos andam “armados” com smartphones.

A obra da Netflix acerta em cheio ao mostrar que dentro de todo o drama que faz parte da adolescência, existe sim muita dor e sofrimento causados pelo convívio num ambiente em que é mais fácil olhar para o lado do que dedicar tempo para ouvir desabafos de jovens. .

O fato é que muitos de nós já passamos por essas mesmas situações no passado. Era diferente em nossa época, como comparei, mas sabemos do que outras pessoas são capazes. Triste que muitos jovens cometam crimes sem realmente considerarem o impacto de suas ações, mas será que devemos mesmo fechar os olhos para a responsabilidade que todos temos em relação aos outros?

É uma série importante e com uma mensagem destruidora para agressores que possuem um mínimo de empatia, como o personagem Zach demonstra. Ou para quem já demonstra traços de psicopatia, como Marcus e Courtney. Infelizmente, a corda sempre rompe para o lado do mais fraco. As críticas acusam os produtores de irresponsabilidade por mostrar cenas explícitas de suicídio e agressões.

Será que não é mesmo necessário agredir de volta todos aqueles que causaram tanto mal para alguém ao ponto dessa pessoa decidir acabar com a própria vida?

13 Reasons Why é um grande marco na cultura pop dos últimos anos. Torço para que sua verdadeira mensagem seja captada por todos e que ela conscientize cada um de nós. Todos podemos fazer alguma coisa para evitar transformar a vida de alguém num pesadelo.

Talvez os produtores tenham alcançado um terreno desconhecido para muitos. Talvez acabem influenciando tragicamente muitas pessoas. Mas talvez a série também possa trazer esperança para muitos jovens com almas torturadas. Talvez ela possa prevenir que alguém tome decisões sem volta ou impedir que agressores continuem impunes.

Existem muitos “talvez” envolvidos aqui, né? A certeza é que os produtores tiveram a coragem de falar abertamente de um tema extremamente forte e presente em nossas vidas. Merecem respeito por forçarem pais, professores e amigos a realmente olharem ao seu redor e enxergarem as pessoas a que dizem amar.

Certo mesmo é que ficar calado está longe de ser uma solução. Recentemente publicamos uma lista de produções que tratam desse tema. Quanto mais se falar em depressão, bullying e assédio, mais chances de evitarmos que histórias assim deixem de ser ficção. Não deixem agressores silenciarem vidas: busquem ajuda!