A Hora Mais Escura

Jessica Chastain foi indicada ao Oscar por A Hora Mais Escura

OS EVENTOS DECORRIDOS DO 11 DE SETEMBRO AINDA VÃO INSPIRAR DIVERSAS OUTRAS OBRAS NO CINEMA, mas talvez seja correto afirmar que A Hora Mais Escura, de Kathryn Bigelow, seja uma das melhores opções disponíveis sobre o tema (ainda que o filme não seja sobre o ataque às torres gêmeas). Especialmente pelo trabalho da talentosa atriz Jessica Chastain, que entra de corpo e alma em sua personagem e merece mais da metade dos créditos pela qualidade da produção. Não foi por acaso que recebeu uma indicação ao Oscar de Melhor Atriz por seu desempenho.

A trama apresenta a investigação dos militares norte-americanos em busca do paradeiro do terrorista Osama Bin Laden. Maya (Chastain) é a encarregada de reunir pistas e depoimentos que acabariam levando o exército a capturar o homem responsável pelo maior ataque terrorista da história. Bin Laden foi morto em 2011, durante uma ação surpresa da CIA.

A Hora Mais Escura começa com a tela preta e o público ouvindo as vozes de algumas das vítimas dos três atentados ocorridos em setembro de 2001. A estratégia pode ser familiar para quem viu recentemente Tão Forte e Tão Perto, de Stephen Daldry, mas o resultado deixa o espectador abalado pela lembrança. A tela preta faz com que a gente imagine aquela situação, crie aquelas pessoas, e não há nada mais eficiente que o poder da sugestão. Um breve e brilhante começo de filme.

Logo na sua primeira cena, Maya dá a impressão de ser uma mulher frágil. Seu rosto delicado parece condenar o companheiro, Dan (Jason Clarke), que tortura um prisioneiro sem demonstrar o menor remorso. No entanto, Maya logo se revela uma mulher forte e determinada, incapaz de se deixar abater pelos riscos e dificuldades burocráticas para cumprir sua missão. Se analisarmos um pouco mais da personagem, podemos afirmar que ela é uma virginiana crônica. A sua dedicação permanece inabalada e ela trabalha incansavelmente, chegando até a incomodar alguns colegas pelo seu jeito meio “CDF”. Percebemos a sua humanidade ao observarmos o papel de parede de seu computador com o retrato de uma companheira morta, e especialmente após completar o trabalho consumiu quase 10 anos de sua vida.

As cenas de tortura são fortes. Bigelow não fez corpo mole e mostrou para o público pelo menos parte do que acontece com os prisioneiros de Guerra. Dan chega a repetir várias vezes a frase: “Quando você mente para mim, eu machuco você”, como maneira de aterrorizar sua vítima. Fica provado que a tortura física acaba revelando pouca eficiência, perdendo em muito para os danos psicológicos sofridos pelos reféns. Sobra até mesmo para o Metallica, banda que foi usada pelos militares como parte da tortura. Não pela música ser ruim, mas por toda a agressividade das faixas cantadas por James Hetfield e cia.

Jessica Chastain Zero Dark Thirty

Se torturar um prisioneiro para conseguir informações é certo ou errado, não cabe a discussão (“Os fins justificam os meios”, dizem por aí, não é?). Seria um grande equívoco reduzir A Hora Mais Escura a uma propaganda da CIA ou como uma apologia à violência. Como cinema, acredito que as reclamações sejam apenas a reação natural do público conservador que não consegue encarar uma obra de ficção que tenta se aproximar da realidade, que todo mundo imagina ser bem pior. E não tomei cerveja demais hoje para falar sobre minhas posições políticas ou se estou ou não de acordo com ações opressivas dos “donos” do mundo.

Mark Boal retoma sua parceria vitoriosa com Bigelow com sucesso. Vencedor do Oscar de Melhor Roteiro por Guerra ao Terror (que também venceu o prêmio de Melhor Direção e Melhor Filme, em 2010), Boal recria toda a atmosfera de tensão da época de maneira natural. O mérito da dupla está em não se deixar levar pela necessidade de agradar qualquer tipo de público, evitando grandes momentos de ação e tornando o ritmo de A Hora Mais Escuro tão (ou mais) arrastado que o trabalho anterior. Pelo menos o novo trabalho realmente merece elogios e é melhor que o superestimado Guerra ao Terror. A única excessão é no terceiro ato, quando as tropas lideradas pelo personagem de Joel Edgerton (Guerreiro) iniciam a missão de matar Bin Laden. Não se trata de uma sequência memorável de ação, mas Bigelow ofereceu uma visão aceitável de tudo que ocorreu naquela noite. Da ação propriamente dita até o nervosismo daqueles soldados que entrariam para a história do país depois de acabar com o vilão.

Destaque para o trabalho expecional do compositor Alexandre Desplat na trilha sonora, especialmente no momento descrito acima. A faixa “Seals Take Off” é perfeita para aumentar o clima de tensão da cena. De um lado, temos Maya concentrada e ansiosa com o desfecho da ação, e do outro, temos todos aqueles soldados encarregados da missão mais importante de suas vidas. A ausência de músicas também é importante, como durante a cena que representa o atentado sofrido dentro de uma base militar norte-americana no Afeganistão, em 2009.

Duvido que algum dia Bigelow produza alguma coisa melhor que Caçadores de Emoção, ainda mais com duas produções super elogiadas em sequência. É uma pena que a talentosa diretora tenha optado por um caminho tão sóbrio, mas apenas uma minoria irá compartilhar da minha opinião. Afinal, não é todo cineasta capaz de reproduzir com tanto realismo o clima das guerras modernas, e quem ganha com isso são os cinéfilos de plantão. A Hora Mais Escura merece a atenção recebida e pode ser considerada como o capítulo final de uma lista filmes que abordam o 11 de setembro, como Voo United 93, de Paul Greengrass; World Trade Center, de Oliver Stone; dentre outros.

poster zero dark thirty

[tresemeia]