Dançando no Escuro

(Dancer in the Dark). De Lars von Trier. Com Bjork, Catherine Deneuve, David Morse, Peter Stormare.

Mais uma bela história do bom e velho Lars von Trier. Mas desta vez, diferente de sua (outra) obra prima Dogville, com uma forte carga dramática, embora nunca gratuita. Acompanhamos desta vez a história de Selma (Bjork), imigrante tcheca que chega aos Estados Unidos com o objetivo de conseguir dinheiro para custear uma operação para seu filho, que sofre do mesmo mal que ela: está ficando cego, gradualmente. Para isso trabalha dia e noite numa fábrica, ao lado de sua melhor amiga e protetora Kathy (Catherune Deneuve, ainda linda) e com seu “paquera” Jeff (Peter Stormare). Selma é apaixonada por musicais, o que lhe garante algum tipo de olhar mais positivo sobre a vida humilde e dura que vive. Sempre que ouve sons, começa a compor pequenas musicas em sua cabeça, e vive em seu imaginário, cenas coreografadas e com lindas canções, como se fosse a protagonista de seu próprio musical.
O que temos aqui, não é um musical convencional. Aquela desculpa de que “musical é chato, porque as pessoas começam a cantar do nada” (opinião daqueles que não gostam desse tipo de filme…), não cabe aqui, até porque a primeira canção demora para aparecer. E as musicas tem total razão de ser: tranformar os problemas que Selma enfrenta em uma distração para sua rotina sofrida.

Falando nisso, o filme não seria nada sem Bjork. A princípio a cantora seria apenas uma colaboradora de von Trier na composição da trilha, mas, depois de um ultimato do diretor, (ele não realizaria o filme com outra pessoa), ela acabou encarnando Selma. A escolha é a mais acertada. Ainda lembrando um pouco a heroína vivida por Nicole Kidman em Dogville, Selma conserva seu olhar inocente todo o tempo. Seus valores são inabaláveis e ela não abre mão deles mesmo quando é sua própria vida que está em jogo. Sua feição é das mais ternas que já vi em um filme, e seu amor pelos musicais se evidencia de uma forma suave, nada forçada, com um verdadeiro amor de fã. Como na fala em que Selma explica a sua amiga Kathy sobre o porque de nunca assistir aos musicais até o fim (parafraseando a personagem): “É porque não gosto das últimas músicas. Tem toda aquela orquestra e aquela clima de final! Assistindo até a penultima música é como se o filme nunca acabasse para mim…”.

Bjork realmente é muito talentosa (ganhou a palma de ouro em Cannes pelo papel), e em suas cenas mais fortes, de quando Selma é presa por um crime que não cometeu, o choro é quase que a última alternativa de alguém que já não tem forças para suportar a situação, até porque, na cadeia é silencioso demais, para que continue vivendo seu musical.

A cena final é de arrepiar (mesmo agora ao lembrar dela para escrever sobre). É uma mãe dedicada que está ali. E o amor incondicional que ela sente por seu filho, não acabará nunca, desde que não cante a última e derradeira canção. Vale a pena pela beleza das canções e das cenas rodadas por Lars von Trier, mesmo que feitas com aquele realismo herdado do movimento fundado pelo diretor, o Dogma 98. Não deixe de assistir!