Filmes para você se tornar uma pessoa melhor

Por mais absurda que seja – e é! -, essa é uma lista de filmes para quem quer se tornar uma pessoa melhor. Solicitação feita por encomenda.

Como uma receita, é só seguir as instruções. Nada muito difícil: leia isso e no dia seguinte você estará doando dinheiro para a caridade e ajudando cegos atravessar a rua. Mas, começar por onde?

Uma Voz nas Sombras

Lição 1: Altruísmo – Uma Voz nas Sombras

Um pouco de altruísmo não faz mal a ninguém. Em um mundo em que muito das nossas relações estão baseadas em interesses, fica realmente difícil imaginar que existam pessoas que empregam ações com o intuito de ajudar o outro sem necessariamente receber algo em troca.

Isso não é novo, tanto que o mote de Uma Voz nas Sombras (Ralph Nelson, 1963) é justamente este. Ao fazer uma parada para consertar seu carro, Sidney Poitier conhece uma pequenina comunidade de freiras que passam a achar que Deus o enviou para ajudá-las na construção de uma capela. Só que ele não tem motivos, nem interesse e sabe que não haverá qualquer reconhecimento por aquele feito. Para que então se enfiar num trabalho braçal exaustivo, que lhe tomará tempo e que não lhe dará algo em troca?

Não sei responder. Afinal, eu mesmo não acredito em altruísmo. Acho, inclusive, que o comportamento altruísta é “o mais esperto dos disfarces que o egoísmo calculista pode assumir”, como dizia Pierre Bourdieu. E também que o cálculo econômico não cessa mesmo quando aparenta total desinteresse, que a sociedade possui sua base em uma economia de práticas, que as relações entre as pessoas são regidas por motivos, interesses e objetivos e, por fim, que o altruísmo gera gratidão, moeda nobre e desejada por muitos, desde que os esforços valham a pena.

De qualquer forma, quanto ao filme, vale a pena. Tanto para se sentir tocado pela história, como para conhecer o trabalho que valeu o primeiro Oscar de um ator negro na categoria principal (30 anos após o Oscar existir, o que mostra que eles precisam ler essa lista na Academia).

Como se fosse a primeira vez

Lição 2: Perseverança – Como se Fosse a Primeira Vez

Se você é um dos que já estão querendo desistir da lista, talvez um pouquinho de perseverança pode te fazer bem. A vida é difícil mesmo e ficar desistindo fácil das coisas o tempo todo não leva ninguém a lugar nenhum. E Como se Fosse a Primeira Vez (Peter Segal, 2004) é um bom exemplo disso.

Adam Sandler se apaixona pela Drew Barrymore e tenta conquistá-la. Até aí, beleza. Só que ele tem que fazer isso todos os dias, pois ela sofre de uma tal Síndrome de Goldfie que a faz esquecer de tudo ao acordar no dia seguinte.

Normal rolar um mea culpa depois de assistir esse filme, lembrar daquele relacionamento perdido, ou o de agora, que também pode estar indo pro mesmo caminho.

E, para além da história fictícia, Adam Sandler, mesmo com tantos filmes ruins que já tinha feito e que continua fazendo, nos mostra que perseverar dá bons resultados.

Um Dia de Furia - Michael Douglas

Lição 3: Paciência – Um Dia de Fúria

Tente lembrar de um “piti “ que tenha dado algum resultado efetivo. Já que raivinha não resolve parada nenhuma, paciência é a alma do negócio. Como adquiri-la, não sei.

Michael Douglas entra numa lanchonete qualquer em Um Dia de Fúria (Joel Schumacher, 1993), faz um pedido e acaba por mostrar onde pode nos levar esse negócio de ficar com os nervos à flor da pele. Um bom exemplo que sempre é preciso um pouco mais de calma, mesmo quando acaba.

E pensar tudo que ele queria era chegar a tempo para a festa de aniversário de sua filha.

Mas, se após assistir à cena da lanchonete você conseguir ver, no absurdo da reação do personagem de Michael Douglas, alguma lógica, é sinal que há traços de empatia em você.

Gran Torino - Clint Eastwood

Lição 4: Empatia – Gran Torino

É a nossa capacidade de entender e de se colocar no lugar do outro que faz um mundo melhor. Empatia não se trata de achar que “todos somos iguais”. Somos diferentes. Aceitar as diferenças, com respeito, que é o pulo do gato.

Eis que estaciona na nossa lista o Gran Torino (Clint Eastwood, 2008). Walter Kowalski (Clint) é um cara solitário, ranzinza, preconceituoso, xenófobo, entre outras “não qualidades”. Vê sua antiga vizinhança se tornar um reduto de imigrantes asiáticos pobres e, claro, vê neles a explicação para os males do mundo. Mas, à medida que se aproxima deles, passa a sentir empatia pela sua cultura hmong (originária do sul da China). Gran Torino nos faz perceber que o mundo não é o nosso quintal e que podemos nos identificar com quem tem uma cultura tão distinta da nossa ao mesmo tempo que ficamos tão distantes dos nossos próprios familiares.

clube de compras dallas

Lição 5: Resiliência – Clube de Compras Dallas

Em Clube de Compras Dallas (Jean-Marc Vallée, 2013) o respeito à diversidade é também trabalhado, ao contar a história de um “machão” preconceituoso que, após contrair AIDS, aos poucos vai aprendendo a conviver com uma travesti, criando uma complexa e profunda relação de amizade.

A capacidade de ambos os personagens (Matthew McConaughey e Jared Leto, respectivamente) de resistir à pressão e aos obstáculos da vida, adaptando-se e criando oportunidades através das inúmeras dificuldades (de saúde à financeiras), é uma ode à RESILIÊNCIA.

A Mulher Faz o Homem

Lição 6: Honestidade – A Mulher Faz o Homem

Para resistir num mundo cheio de problemas não vale fazer qualquer coisa, tampouco não ter escrúpulos. Principalmente para quem quer ser uma pessoa melhor, honestidade é essencial. Lembrando que essa qualidade não está vinculada somente ao dinheiro, mas ao proveito imoral de toda e qualquer vantagem indevida.

Em A Mulher Faz o Homem (Frank Capra, 1939) a gente pode sentir o gostinho de ser moralmente incorruptível. Clássico absoluto do cinema, traz no enredo Jefferson Smith (James Stewart), um interiorano alçado a senador para ser manipulado pelo poder instituído. Aos poucos, convicto de seu caráter simples, porém honesto, trava uma batalha de Davi e Golias contra aqueles que querem corrompê-lo. De quebra, o filme de Frank Capra nos lembra que honestidade não é algo que você tem guardado na carteira como a foto dos filhos, pronto para ser mostrada para quem quiser ver. Praticar é a única forma tê-la.

Cantando na Chuva

Lição 7: Dignidade – Cantando na Chuva

O bordão “quem está na chuva é pra se molhar” deveria vir acompanhado de “mas com dignidade”. Em Cantando na Chuva (Donen e Kelly, 1952), o personagem de Gene Kelly (Don Lockwood) tem consigo esse lema: “Dignidade, sempre dignidade”, ao mesmo tempo em que, em flashbacks, é mostrado ao público uma vida cheia de dificuldades.

Considerado por muitos como o melhor musical de todos os tempos, a ironia está no fato de que Gene Kelly tratava as pessoas bem diferente do lema de seu personagem: de forma um tanto quanto indigna e torturante durante toda a filmagem. Mas se os bastidores nem sempre são os melhores lugares para se inspirar, vale a pena centrar-se na história que conta, com leveza e humor, a difícil transição do cinema mudo para o falado.

Curtindo a Vida Adoidado

Lição 8: Diversão – Curtindo a Vida Adoidado

Ninguém torna-se uma pessoa melhor sendo um chato. Se divertir, extrapolar, ser gente boa é essencial para levar a vida e Ferris Bueller dá uma boa aula sobre isso. Sei que você já viu mais de uma vez na sessão da tarde mas, como até a Wikipédia afirma, Curtindo a vida adoidado (John Hughes, 1986) é “notável por ser uma obra cinematográfica que o espectador não se cansa de rever”. Simplesmente reveja. E inspire-se.

Obrigado por Fumar

Lição 9: Querer estar menos “certo” das coisas – Obrigado Por Fumar

Um dos vícios que deveríamos largar é de querer convencer os outros, a todo momento, daquilo que acreditamos (por mais que esse conselho não faça o menor sentido no contexto dessa lista). Em Obrigado Por Fumar (Jason Reitman, 2005), Aaron Eckhart tem a função de defender a indústria tabagista. Numa cena hilária, chega a colocar a culpa do sofrimento das crianças com câncer nos grupos contrários ao cigarro, tudo com aquele sorriso na cara de “satisfeito, ganhei a discussão”. Mais tarde, tentando se divertir com seu o filho em um passeio, diz:

– Suponhamos que você defenda o sorvete de chocolate; eu, o de baunilha. Você dirá que o seu é a melhor coisa do mundo. Eu direi que a melhor coisa do mundo é poder escolher entre chocolate e baunilha.
– Mas com isso você não me convenceu de que baunilha é melhor, diz seu o filho.
– Mas eu não quero te convencer, quero só provar que estou certo e você errado.
Enfim, querer estar sempre certo não significa estar sempre certo. Baixar a bola é essencial. Por isso é importante dizer: essa lista é a receita perfeita para NÃO MUDAR NADA EM VOCÊ, quanto mais te transformar em alguém melhor. Mas, ao menos, assistirá a bons filmes.

E para aquele que mesmo com todas essas indicações não entendeu nada e se sente um tanto perdido, uma última indicação: Monty Python em O Sentido da Vida (Jones e Gilliam, 1983). Talvez ache alguma resposta lá. Ou não.

Monty Phyton O Sentido da Vida lista