TOP 5 – O melhor de Philip Seymour Hoffman

Tarefa ingrata é tentar elencar, em um ranking, as melhores atuações de seu ator favorito. A chance de ser injusto e de ficar revoltado consigo mesmo é enorme. Ainda assim, decidi fazer tal imbecilidade como uma forma de homenagem, para marcar minha estreia no site Cinema de Buteco. Porém, como forma de aliviar minha culpa, criei 3 regras para este post: 1) Não são os melhores filmes e, sim, as melhores atuações do ator; 2) Os 5 filmes indicados não estão em ordem nenhuma; 3) Dividi o fardo com a querida jornalista Débora Anício, que teve o poder de opinar sobre as 5 obras e, no fim, realizar suas considerações finais.

Estamos falando de Philip Seymour Hoffman, ator norte-americano falecido em 2014, em decorrência de uma overdose. Oriundo do teatro, Hoffman sempre apresentou atuações profundas e com diversas camadas apesar de, quase sempre, ser coadjuvante. Poucos são os atores que conseguem dominar a tela e se sobressair com performances sutis e sem exageros, mas para ele bastava um olhar e um cruzar de braços para demonstrar um talento incomparável. Além de tudo isso, é possível encontrá-lo em dramas como O Talentoso Ripley e comédias como Os Piratas do Rock; em clássicos como Patch Adams e blockbusters como Missão Impossível 3; em filmes adultos como Antes que o diabo saiba que você está morto e jovens como Jogos Vorazes; além de trabalhos na TV e no teatro. Polivalente e competente em todos os estilos, Seymour Hoffman era querido e admirado por grandes atores e diretores, principalmente, Paul Thomas Anderson, com quem trabalhou em cinco oportunidades. Nos últimos anos de sua vida, principalmente após vencer o Oscar em 2005, passou a ser protagonista e concluiu, com maestria, sua carreira.

Mais que um TOP 5, este post é uma homenagem de um fã (que assiste suas obras em doses homeopáticas, para que nunca acabe) para um Mestre (sim, com M maiúsculo), que já me arrancou alguns sorrisos, mas que sempre me arranca lágrimas. Philip Seymour Hoffman, o ator que está nos três filmes TOP 3 da minha vida.

MAGNÓLIA

(Magnolia, Paul Thomas Anderson, 1999)

A obra-prima de Paul Thomas Anderson costura, de maneira comovente, um complexo mosaico de remorsos e lágrimas. Lágrimas que desabam como chuva (e que chuva!) sobre a vida de diversos personagens que buscam a redenção, perdão ou, simplesmente, uma razão. Em suas 3h09min de profunda emoção, Magnólia é um exercício de catarse e autoconhecimento, com um roteiro denso, direção primorosa e elenco impecável.

Philip Seymour Hoffman (em sua 3ª parceria com PTA) interpreta Phil, um enfermeiro responsável por cuidar de um milionário idoso à beira da morte. Envolvido pelos fantasmas do passado da família para qual trabalha (composta por Jason Robards, Julianne Moore e Tom Cruise), Phil se vê em um conflito intenso com seus sentimentos e suas convicções. Com uma alma gigantesca e um olhar de sinceridade poética única, Hoffman faz de seus poucos minutos em tela, uma atuação memorável.

Débora Anício: “Difícil escolher a melhor atuação de PSH no cinema, mas essa com certeza é uma das melhores. É pelo olhar de Phil (ator e personagem carregam o mesmo nome, coincidência? Não sei :)) que enxergamos o absurdo de todas as situações. Enquanto todos parecem engessados com seus problemas e dramas, Phil se mostra incomodado com o que vê. Não é à toa que ele é o único personagem a se espantar com o apoteótico acontecimento final e questiona por meio de seu choro se é o único a perceber que o que acontece não é normal. Phil é a persona sensível em meio a tantas almas perdidas acostumadas com a dor. PSH leva para Magnólia o humano que todos precisamos ser para nos libertarmos de nossas amarras emocionais”.

Philip Seymour Hoffman Magnolia


SINÉDOQUE, NOVA YORK

(Synecdoche, New York, Charlie Kaufman, 2008)

Ousadia maior que a de Charlie Kaufman (em sua primeira experiência como diretor) ao construir esta obra seria tentar escrever uma sinopse sobre ela. Todos os sonhos e todas as dores do mundo estão no coração (e na mente) de Caden Cotard, um personagem símbolo de um universo existencialista que analisa (ou não) o mais profundo interior humano. O ponto de partida é a história de um diretor teatral que prepara sua próxima peça e enfrenta problemas dos mais diversos tipos com as mulheres de sua vida.

Seymour Hoffman é o condutor do espetáculo e o espetáculo é Seymour Hoffman. Presente em quase todas as cenas da película, o ator desenvolve seu personagem mais grandioso e complexo. Aos poucos, o espectador perde a capacidade de distinguir o que é realidade e delírio, encenação teatral e encenação rotineira, o que é Caden, o que é Hoffman, o que é Kaufman, quem sou eu, quem é você.

Débora Anício: “Não ter visto esse filme não é apenas meu pecado cinéfilo, mas uma falha de caráter pra quem se diz fã de Philip Seymour Hoffman. A presença dele nessa lista só reforça que preciso me apressar pra assisti-lo logo”.

Philip Seymour Hoffman Sinedoque


CAPOTE

(Capote, Bennett Miller, 2005)

Fugindo da receita chata e manjada das cinebiografias, Capote não tem a intenção de contar a vida do escritor Truman Capote e, sim, de narrar uma passagem de sua carreira (com direito a Harper Lee e tudo mais), quando desenvolvia sua obra A Sangue Frio, um marco do jornalismo literário. Apesar da bela fotografia e da competente direção de Bennett Miller, o grande destaque da obra e que será lembrado eternamente é a atuação mediúnica de Seymour Hoffman.

Capote foi o personagem que deu o Oscar de Melhor Ator para Hoffman e, com certeza, o colocou na lista das maiores interpretações de uma personalidade real. Despido de qualquer sinal que comprove ser ele um ator, Hoffman toma para si a voz de Capote, o rosto e o corpo de Capote, os trejeitos, olhares e manias de Capote. Philip Seymour Hoffman ressuscita Truman Capote e entrega, mais uma vez, um trabalho poderoso.

Débora Anício: “Se alguém assistiu a todos os filmes do ator, mas não viu Capote, certamente esse alguém não reconhecerá o ator em cena. E isso é o magnífico a respeito do saudoso astro, é difícil reconhecer seus trejeitos pessoais em qualquer filme, e aqui é simplesmente impossível. PHS não interpreta Capote, ele é Capote. Durante a projeção as perguntas que ficam são: como ele faz isso? Onde está sua voz? Onde está PSH? Hoffman não tinha estrelismo para se sobrepor ao personagem, mas se apagava totalmente para só restar quem importa: o personagem”.

Philip Seymour Hoffman Capote


O MESTRE

(The Master, Paul Thomas Anderson, 2012)

Obra polêmica de Paul Thomas Anderson, que traz o melhor combo dos últimos anos (eu diria de todos os tempos, mas achei demasiado radical): Philip Seymour Hoffman, Joaquin Phoenix e Amy Adams. Apesar de ter sido indicado ao Oscar de Ator, Ator Coadjuvante e Atriz Coadjuvante, o filme foi escondido pelo mercado, por tratar de temas como a Dianética e a Cientologia, assuntos proibidos em Hollywood. Em uma troca inacreditável, o filme constrói personagens tão ricos que, com certeza, serão estudados, futuramente, em escolas de roteiro.

Hoffman (em sua última parceria com PTA) interpreta Lancaster Dodd, líder de uma organização religiosa, que conhece Freddie Quell, um homem perturbado por traumas da Guerra e o inicia em seus rituais. A relação entre os dois se desenvolve de tal maneira que se torna impossível definir quem é o mestre de quem. As atuações se contrapõem, se somam, se misturam e se alteram com o decorrer da obra. Um futuro clássico cult. Genial.

Débora Anício: “Um grande ator se mantém grande contracenando com colegas talentosos ou não. Trabalhando com dois talentosíssimos atores (dos melhores de sua geração), a interpretação de Hoffman só melhora. As nuances são tantas que é difícil saber até que ponto ele é o mestre ou o discípulo. A conexão com a esposa e a fragilidade mostrada diante dela ajudam a construir um complexo personagem. A relação com Phoenix é estranha, ao mesmo tempo em que um tenta se impor ao outro, eles rolam no chão como cão e dono. O Mestre é um filme para ser visto, revisto e visto novamente”.

Philip Seymour Hoffman O Mestre


BOOGIE NIGHTS – PRAZER SEM LIMITES

(Boogie Nights, Paul Thomas Anderson, 1998)

Comédia dramática que narra os bastidores da indústria do cinema pornográfico nos anos 70. Eddie Adams, personagem vivido por Mark Wahlberg, é descoberto como um fenômeno erótico, por possuir um órgão genital gigantesco. A fama e o dinheiro transformam a vida do jovem, que acaba por se envolver em um submundo de drogas e crime.

Novamente coadjuvante, Philip Seymour Hoffman (em sua 2ª parceria com PTA) rouba a cena e é o grande destaque do filme. Com um personagem ao mesmo tempo cômico e dramático, comove o espectador com seu sentimento honesto e uma cena, inesperadamente, emocionante.

Débora Anício: “Esse é talvez o personagem mais leve da carreira de Seymour Hoffman. Sem grandes pressões na vida pessoal e profissional, Scooty só se preocupa em curtir a vida e achar alguém que goste dele. O personagem é simples e não tem tanto espaço, mas o carisma de PSH atrai os olhares para ele – como sempre”.

Philip Seymour Hoffman Boogie Nights


Considerações finais de Débora Anício:

“Escolher os melhores filmes da carreira de Philip Seymour Hoffman é uma tarefa difícil. Mas além dos títulos citados acima, é dever de todo cinéfilo e fã de PSH assistir:

Quase Famosos: em que ele interpreta um cansado, mas ainda apaixonado crítico musical.

Ninguém é Perfeito: onde ele dá vida a um homossexual que flerta com a caricatura pelo figurino, mas jamais cai nela devido a condução do ator.

Mary e Max: uma animação profundamente triste, mas que traz discussões pertinentes ao nosso tempo. PHS leva uma carga emocional fortíssima a Max por meio de uma voz poucas vezes imprimidas em outros personagens.

O Homem Mais Procurado: um dos últimos filmes de sua carreira e que (sem surpresa) traz um PSH diferente do que vimos até então. Ver mais uma vez a prova de versatilidade do ator chega a doer, por saber que não o veremos mais em cena.

Dúvida: filme que jamais existiria sem o talento de seu elenco. Com atuações brilhantes, chegamos ao final da película da mesma forma que começamos: com dúvida. PHS interpreta um padre que pode ser o vilão ou a vítima, mas jamais saberemos; e é difícil sentir compaixão ou ódio pelo personagem tamanha complexidade imprimida pelo ator em seus gestos, olhares e falas”.