Acompanhe o crítico de cinema João Marcos Flores, do Cineviews, na sua cobertura completa da 41ª Mostra de SP com comentários e críticas dos filmes:
Estocolmo, Meu Amor (Stockholm, My Love, Suécia, 2017), de Mark Cousins: A ideia do documentarista e ensaísta Mark Cousins é engenhosa: partir de uma análise arquitetônica e urbanística da capital da Suécia para refletir sobre o “espírito” da cidade – ou seja, sobre as vibrações e energias que ajudam a moldar a personalidade e o humor de seus habitantes. O problema é que, desta vez, o cineasta abre mão do documentário e escreve, ao lado de Anita Oxburgh, um roteiro ficcional sem sal que nos obriga a acompanhar uma atriz que vaga pelas ruas da cidade tendo pensamentos óbvios e desinteressantes “em off”. 2/5
Em Retirada (Walking Out, EUA, 2017), de Alex Smith e Andrew J. Smith: Como história de sobrevivência, o filme funciona ao melhor estilo No Limite (The Edge) e A Perseguição (The Grey), aproveitando bem as paisagens inóspitas do norte dos EUA e a fotografia evocativa de Todd McMullen para estabelecer um clima de isolamento e impotência diante da natureza implacável; já como drama familiar, jamais deixa o lugar comum, permitindo que antecipemos com um alto grau de certeza cada uma de suas batidas, viradas e resoluções. 3/5
Mulheres Divinas (Die göttliche Ordnung, Suíça, 2017), de Petra Biondina Volpe: Sim, sim, sim, a estrutura deste drama de época sobre a luta de um grupo de mulheres suíças pelo direito ao voto é convencional e linear, mas a direção de Petra Biondina Volpe é segura e elegante. Entretanto, méritos e deméritos narrativos e estilísticos à parte, o filme pertence mesmo à espetacular atriz Marie Leuenberger, que nos convence do arco dramático enfrentado pela protagonista em uma atuação discreta, mas expressiva e cheia de delicadeza e humanidade. 4/5
Esplendor (Hikari, Japão, 2017), de Naomi Kawase:
Félicité (Idem, França/Bélgica/Senegal/
Essa É a Nossa Terra (Chez Nous, França, 2017), de Lucas Belvaux: A atriz belga Émilie Dequenne é uma das grandes atrizes do Cinema francês contemporâneo, apesar de receber muito menos atenção do que merece; e aqui, neste seu segundo trabalho consecutivo em colaboração com o diretor Lucas Belvaux, ela é mais uma vez o fio condutor de uma história que ganha força quando se concentra nos dramas de uma mulher moderna e independente em um mundo ainda machista, mas que logo a perde sempre que recorre às obviedades de seu contexto político. 3/5
Não Devore Meu Coração (Idem, Brasil, 2017), de Felipe Bragança: O que o cineasta Felipe Bragança consegue fazer aqui é impressionante: contar uma história que não poderia ser mais brasileira (e paraguaia) em uma narrativa que transita de maneira impecável entre o western (sim!), o drama familiar, o filme-de-motoqueiro ao estilo Roger Corman e o thriller de investigação criminal. O elenco também é consistente e Cauã Reymond contracena com Cláudia Assunção em uma fortíssima cena de conflito entre mãe e filho. 4/5
Ana, Meu Amor (Ana, Mon Amour, Romênia, 2017), de Cãlin Peter Netzer:
O Pacto de Adriana (El Pacto de Adriana, Chile, 2017), de Lissette Orozco: Daqueles documentários que começam com um objetivo e acabam se encontrando no meio do caminho até se transformar em um “bicho” completamente diferente – o que não deixa de fazer um comentário preciso sobre nossa relação com as pessoas que amamos, já que o processo experimentado pela diretora Lissette Orozco envolve as expectativas que alimentamos acerca de nossos familiares e a realidade muitas vezes brutal que estes podem esconder por trás de sorrisos, brindes e danças em festas de natal e ano novo. 4/5
O Motorista de Táxi (Taeksi Woonjunsa, Coreia do Sul, 2017):
Sambá (Idem, República Dominicana, 2017): Com uma trama que segue à risca a cartilha Rocky de ascensão, queda e redenção de um lutador de boxe underdog, este drama da República Dominicana aproveita suas locações para comentar as dificuldades de um país humilde e carente de oportunidades em que o esporte e a criminalidade se apresentam como únicas saídas possíveis a uma juventude que já parece nascer condenada a seguir os passos de seus pais, que entram e saem dos sistemas penitenciários não só de seu próprio país, como de “paraísos de oportunidades” como os Estados Unidos. 4/5
Feio (Ugly, Áustria, 2017): Um dos filmes mais deprimentes que já vi em toda a minha vida. Com um rigor estético e narrativo impressionante, o diretor Juri Rechinsky conta duas histórias paralelas sobre o que há de mais sombrio na experiência humana, falando de doença e morte e também de seu impacto nas famílias afetadas por elas. Sem abrir concessão alguma ao espectador mais frágil, o filme ainda apresenta uma atação simplesmente espetacular de Maria Hofstätter, que encarna com intensidade a decadência de uma personagem cuja sanidade se esvai.4/5
Vida Fácil (Easy Living, EUA, 2017): Em oitenta minutos, a atriz Caroline Dhavernas constrói uma personagem tridimensional, crível e vulnerável que nos faz entender suas dificuldades para manter certa aparência de normalidade em meio ao caos da vida adulta e torcer para que dias melhores venham logo. Já o roteirista e diretor Adam Keleman merece elogios por compreender os conflitos, dilemas e percalços do dia-a-dia de uma típica mulher do século XXI – algo que a maior parte dos diretores homens falham miseravelmente em fazer. 4/5
O Dia Depois (Geu-hu, Coreia do Sul, 2017):
2ª parte:
Satã Disse Dance (Szatan kazal tanczyc, Holanda, 2017): Como experimento narrativo, este filme holandês sobre o fundo do poço do abuso de drogas e do sexo inconsequente é bastante intrigante, se valendo de uma estrutura fragmentada e uma fotografia baseada na estética de dispositivos móveis para observar passivamente a queda de sua protagonista, interpretada pela ótima Magdalena Berus. Infelizmente, não demora muito para a narrativa se entregar à repetição e a digressões pretensiosas que diminuem o impacto esperado pelo espectador. 3/5
1ª parte:
O Outro Lado da Esperança (Toivon Tuolla Puolen, Finlândia, 2017), de Aki Kaurismäki: Um drama minimalista que traz interpretações discretas e humanas para falar da bondade (e também da maldade) humana. Contando duas histórias paralelas que eventualmente se cruzarão, o roteiro se sabota um pouco por ofuscar a trivialidade de uma pela força dramática da outra; mas, através de uma narrativa silenciosa e observadora, fala com delicadeza das dores e dificuldades dos imigrantes do Oriente Médio em uma Europa que sabe abrir os braços, mas também fechar os punhos. 4/5
4 Dias (4 μέρες, Grécia, 2017), de Michalis Giagkounidis: Muito mais oco do que acredita ser, até tem potencial como estudo de personagem, mas acaba não indo a lugar nenhum. Sim, sua estrutura é promissora: todo o arco dramático de sua protagonista é desenvolvido ao longo de quatro dias que se desenrolam não um após o outro, mas espaçados entre imensas elipses; no final das contas, porém, como nos mantermos interessados se nem os objetivos e conflitos da protagonista ficam realmente claros? Nós não sabemos quem é aquela garota e, por isso mesmo, permanecemos indiferentes a ela. 2/5
O Rebanho (El Corral, Argentina, 2017), de Sebastián Caulier: Não sabe bem o tom que quer abraçar, indo da comédia coming of age ao thriller gráfico de serial killer sem qualquer sutileza. Para piorar, o gosto do diretor para efeitos visuais e trucagens de câmera é no mínimo duvidoso; e, apesar do talento do jovem Patricio Penna, que vive o protagonista como um nerd oprimido pela própria introspecção, seu colega de cena Felipe Ramusio o antagoniza com uma atuação over e caricatural que flerta de perto com o constrangimento. 2/5