KSS_JB_D07_00960.tif

A Maldição das Cinco Caipirinhas – Capítulo 8 – O Mistério do Roubo de Kingsman

A Maldição das Cinco Caipirinhas é a primeira obra de ficção colaborativa do Cinema de Buteco. São 10 capítulos de 10 autores diferentes, publicados toda quinta-feira, que contam a história de Orson, um cinéfilo bêbado que conhece uma garota no Tinder e se envolve numa trama tresloucada e improvável. Leia os capítulos anteriores aqui.

Além de continuar a história, cada autor deverá encaixar uma citação cinematográfica no meio do texto. Neste capítulo 8, Graciela Paciência precisou colocar:

“Nem fodendo que eu vou beber a porra de um Merlot.”
(Paul Giamatti em Sideways – Entre Umas e Outras)

Capítulo 8 – O Mistério do Roubo de Kingsman

por Graciela Paciência

De repente, Barretto arregala os olhos e pergunta:

– O que é que você tá fazendo?

– Tô tentando salvar tua vida.

– Onde é que a gente tá?

– Sei lá, numa espécie de açougue humano… Você esqueceu os acontecimentos dos últimos cinco minutos? Estou me sentindo no livro Jantar Secreto.

– Eu não gosto muito de ler…

– Eu sei. Levanta, a gente precisa sair daqui.

Chamo Claudia, Dani e toda a galera que estava presa. Ao sairmos do açougue, percebo que estamos no centro da cidade.

– Vamos lá pra casa – Barretto convida. – Preciso de um banho.

Chegando lá, o anfitrião vai direto pro chuveiro e me pede para colocar “Only”, era a música que o relaxava sempre que estava muito tenso. Eu estranho, mas coloco a faixa sem questionar nada. Guitarras potentes, bateria pesada… Depois de quase 50 segundos de introdução, eis os primeiros versos da música:

Everything is perfect
Everything is sick, that’s it
You can’t tell me to stop it
You can’t tell me not to quit, that’s it

Barretto aparece na sala só de toalha e solta:

– Mas que porra é essa?

– Anthrax. Você nunca me falou que gosta de heavy metal, estou orgulhoso de você.

– Anta, era pra colocar “Only”, do Nine Inch Nails. Quem é o ser perturbado que relaxa ouvindo Anthrax?

Fico com cara de bobo.

– Vou tomar um banho rápido, fiquem à vontade.

– Preciso beber álcool imediatamente – Dani tem o olhar completamente perdido.

– Vou ver o que tem na cozinha. Me acompanhem, a gente tem que juntar as peças desse quebra-cabeça. Claudia, você pode começar me contando o que aconteceu depois do nosso encontro no bar. Pra onde você foi?

Eu encontro vinho e sirvo em três taças.

– Nem fodendo que eu vou beber a porra de um Merlot – diz Dani.

– Então não bebe, sua puta ingrata! Estou esperando você me agradecer por ter te tirado daquele açougue humano!

– Vai se foder, Orson! Não é porque você me tirou de lá que vai falar comigo do jeito que quiser! E me parece que você já tem companhia, né, seu safado? Homem é tudo igual, né? Diz que vai morrer se for rejeitado, mas sempre dá um jeito de esquecer as mágoas no primeiro par de peitos siliconados que encontra.

Ela bate a porta ao sair. Eu sabia que precisava dela para tentar entender tudo o que estava acontecendo, mas a minha parcela de culpa pelo fim do relacionamento e a tentativa frustrada de esquecê-la ao longo dos anos me diziam para deixá-la ir. Era impressão minha ou ela estava morrendo de ciúmes por causa da Claudia? Os seios da Claudia parecem naturais… Será que ela me deixa dar uma apertadinha pra confirmar? Jesus, como minha mente consegue se afastar do meu objetivo tão rapidamente?

– Ok… Claudia, o que aconteceu quando você saiu do bar naquele dia? Pra onde você foi?

Ela fica com o olhar perdido, mas não demora pra responder.

– Não tive tempo de ir a lugar algum. Eu saí do bar, vi que a chuva continuava forte e pensei em voltar, mas uma van preta parou na porta e dois caras me puxaram pra dentro. A propósito, meus seios são naturais, não sei o que a levou a pensar que são siliconados.

Uma van havia pego Claudia na saída do bar… Não podia ser o Paul Giamatti, pois naquele momento ele estava tentando me empurrar mais uma caipirinha.

– E a carteira com os cartões da Dani?

– Que carteira?

Barretto aparece na cozinha só de cueca… da Mulher-Maravilha.

– Mas que porra é essa, cara?

– Mano do céu, eu sei lá o que aconteceu, mas meu guarda-roupa foi revirado. Só tem roupa dos membros da Liga da Justiça. Será castigo por eu ter falado tão mal de Batman vs Superman? Mas o que eu podia fazer? É uma bosta mesmo…

– Qual o propósito de fazerem isso contigo ou com qualquer pessoa do universo?

– Sei lá, véio, mas a cueca é bem confortável. Mais uma coisa: roubaram meu DVD de Kingsman.

– Como você sabe disso? Foi conferir sua coleção de merda numa hora dessas?

– Não, palhaço. Eu encontrei este bilhete e um ingresso de cinema na minha gaveta de cuecas.

Ele me entrega um papel cor-de-rosa escrito “Kingsman está comigo” em letras pretas. Preso a um clipe, um bilhete do filme Lady Jane. Questiono:

– Você foi ao cinema comigo?

– Não! E eu me lembro do que fiz nos dias em que você surtou por aí e foi ao cinema, até falei com a sua amiga do trabalho, a Alice. Sem contar que eu não tenho meios para viajar no tempo.

– Pra que raios alguém ia querer roubar especificamente este DVD? O filme é TERRÍVEL!

– Ah, cara… Não vamos começar de novo. Não é pior do que Batman vs Superman.

Batman vs Superman é para quem manja de HQ, não pra poser que se acha quadrinista. Kingsman é uma ofensa à inteligência humana.

– Vocês vão mesmo discutir cinema AGORA? Porque se forem, eu queria acrescentar que estes filmes de ação não têm roteiro decente. Vocês nunca devem ter assistido a Missão: Impossível, Duro de Matar, Olhos de Serpente e 8 milímetros, né? – O quê? Eu achava que Claudia era a única pessoa sensata na casa, mas, de algum jeito, ela estava comparando filmes de ação dos anos 1990 com Batman vs Superman. O que deram a essa pobre criança?

Alguém bate na porta, e o imbecil do Barretto abre sem pestanejar. Eu mal posso acreditar! É a Alice! Ela está vestida de Mulher-Gato, tapa a boca da Dani com uma mão e com a outra segura uma seringa com o líquido verde perto do pescoço da minha ex.

– E aí? A gente não sabe qual vai ser o efeito disso no corpo da vadiazinha aqui, então eu acho melhor vocês me obedecerem antes de pensarem em me questionar.

***

Estamos na reta final! A saga de Orson continua na próxima quinta-feira, aqui mesmo no Cinema de Buteco. O penúltimo capítulo ficará a cargo de Andrey Lehnemann, que deverá encaixar a citação: 

Tem um lugar que vende shawarma a uns dois quarteirões daqui.
Eu não sei o que é isso, mas tô a fim de experimentar.
(Tony Stark em Os Vingadores)

Organização e edição: Lucas Paio
Arte: Renato Trindade