Jobs

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UMA MARCA COMO A APPLE CONQUISTA A ATENÇÃO E O AMOR DO CONSUMIDOR POR OFERECEREM MAIS DO QUE UM PRODUTO DE QUALIDADE: ela garante um status. Quem tem um iPod, um iPhone, ou o “iTreco da moda” é diferenciado. Para estudantes de comunicação, ou fanboys da maçãzinha, Jobs é uma experiência interessante para apresentar (se é que isso é possível) a Apple e o homem responsável por criar a marca mais desejada do mundo. Ainda assim, como filme, a produção estrelada por Ashton Kutcher deixa um pouco a desejar.

De certa forma, podemos afirmar que Jobs é uma espécie de remake de A Rede Social, de David Fincher. Acompanhamos os primeiros passos do jovem Steve Jobs e seus companheiros geeks, da época em que eram apenas adolescentes com uma ideia dentro de uma garagem apertada até o retorno triunfal de Jobs para a empresa na metade da década de 90. A grande diferença de uma obra para a outra é a motivação do protagonista: ao contrário do Zuckerberg de Jesse Eisenberg, não há uma garota para ser conquistada. Jobs tem um sonho ambicioso e não medirá esforços para cumprir seu destino, ainda que isso o transforme num imbecil ganancioso, manipulador, vingativo, dentre outros adjetivos pouco agradáveis. Não que a personalidade de Jobs importe ou vá modificar a imagem da empresa para os seus usuários, mas é interessante conhecer outras facetas do talentoso midas da tecnologia.

O problema principal de Jobs é a maneira truncada e confusa como a narrativa é desenvolvida. O roteiro não resolve os conflitos apresentados para o espectador, como na cena em que Jobs, sua namorada, e seu melhor amigo estão “viajando” com LSD. O nosso “herói” possui daddy and mommy issues, mas isso não é trabalhado. Em outro momento, após humilhar a namorada grávida (seria o medo de ser pai ou o medo da gravidez atrapalhar seus sonhos?) e aparentemente negligenciar a filha por anos, o espectador é surpreendido ao ver que a adolescente está dormindo na casa do pai. Parece não importar quando/como a relação dos dois foi reatada e cabe ao espectador imaginar como poderia ter acontecido. James Woods faz uma pequena ponta na introdução dando a entender que seu personagem poderia ter alguma influência na vida de Jobs, mas simplesmente desaparece.

O elenco, liderado por Kutcher, é caricatural, mas como podia ser diferente? O encerramento brega (com fotografias reais das pessoas retratadas) mostra que a realidade não foi lá muito distorcida na ficção: assim como críticos de cinema tendem a ser estranhos e feios, os tarados por tecnologia são adolescentes com o rosto cheio de espinhas e que nunca conseguiram se enturmar com os mais populares da escola. Kutcher, em um dos melhores momentos de sua carreira, encarnou Jobs e, independente de ser um ator limitado, consegue convencer. Não chega a roubar a cena como Jesse Eisenberg fez em A Rede Social, mas certamente está bem o suficiente para fazer o filme funcionar. Josh Gad (que também está na comédia Os Estagiários, sobre o Google) está agradável como o companheiro de Jobs na criação da Apple. .

É curioso observar a jornada de Jobs, da sua origem (onde já demonstrava falhas de caráter) até os primeiros passos rumo ao sucesso, os excessos que o fizeram ser exilado da empresa, e o seu retorno triunfal para salvar a Apple da falência. Os defeitos de Jobs em momento algum são idolatrados, o que acaba sendo um grande acerto da obra, mas é frustrante que a evolução dele como pessoa não seja abordada. Isso deixa um gosto amargo para o espectador, que fica perdido sem entender se Jobs aprendeu lições depois de ser exilado e conseguiu amadurecer ao ponto de reconhecer os seus erros e acertos.

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A introdução é o melhor momento da obra, resumindo o talento de Steve Jobs em apresentar seus produtos e toda a magia da Apple. Quando se trata de oratória, não existe uma pessoa melhor para ser estudada, especialmente por representar uma marca tão amada. Só mesmo a Apple para conseguir inflamar a plateia e receber aplausos de pé para o anúncio de um pequeno e revolucionário aparelho chamado iPod. Para a nossa geração, nenhuma outra marca representou tanto e está tão presente em nosso cotidiano. Independente de ser usuário ou não da maçãzinha, o discurso inicial de Jobs é arrepiante. Não se pode ignorar que a dinâmica da sequência é potencializada com os cortes e os ângulos da câmera, que são fundamentais para alcançar um resultado tão mágico.

Se você entrar na sala de cinema esperando uma cinebiografia centrada nos problemas pessoais de Jobs e que deixe a Apple em segundo plano, desista. Ao contrário do que acontece em A Rede Social, onde os personagens são mais importantes que a marca, os primeiros passos da Apple são maiores que todos os envolvidos. Claro que é praticamente impossível dissociar Jobs da Apple, afinal tudo foi criado e desenvolvido a partir das suas vontades e caprichos, e o filme sabe disso. O espectador precisa levar isso em consideração. Exceto se for um estudante de comunicação sedento por uma produção que valorize uma marca, da sua criação, do desenvolvimento de seu conceito, até o momento em que vira líder do mercado. Para esse público, Jobs será tão bom quanto um convite para tomar uma cerveja gelada depois do expediente na sexta-feira.

A Sony Pictures também está produzindo uma cinebiografia inspirada em Steve Jobs. O roteirista Aaron Sorkin (A Rede Social) será o responsável pela adaptação do best-seller Steve Jobs: A Biografia, de Walter Isaacson, que promete destacar mais a vida do que as criações de um dos homens mais importantes dos últimos tempos.

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Nota:[tresemeia]