critica meu namorado é um zumbi

Meu Namorado é um Zumbi

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COMO UM BOM FÃ DE FILMES DE ZUMBIS, sejam eles clássicos ou modernos, e por ter uma queda por (boas) paródias de temas que aprecio, acredito que Meu Namorado é um Zumbi, de Jonathan Levine, cumpra bem o seu objetivo de entreter o espectador, especialmente se esse for um fã “cabeça aberta” dos mortos-vivos. Porém, a adaptação do romance publicado no Brasil como Sangue Quente poderá deixar os mais xiitas vivendo o mesmo pavor que os admiradores dos vampiros sentiram quando Crepúsculo se transformou em fenômeno.

A trama apresenta R (Nicholas Hoult), um zumbi simpático que aparentemente pensa demais sobre a sua entediante rotina. Ele mora em um aeroporto com outros Carnudos (zumbis que ainda preservam boa parte de seus corpos e hábitos de quando eram vivos) e os perigosos Ossudos (zumbis que têm apenas osso e tecido podre e que são assustadores – pelo menos tentam) Durante uma caçada por comida, R acaba encontrando Julie (Teresa Palmer), e se apaixona. Começa então uma verdadeira revolução na vida e comportamento dele e dos outros zumbis, que adquirem a capacidade de se expressar e controlar seus impulsos por carne humana vivinha.

O roteiro não se preocupa em detalhar o apocalipse zumbi, preferindo focar especialmente no desenvolvimento de seus personagens e em pequenas referências a várias outras obras do gênero. Um exemplo é a semelhança do aeroporto, local em que os Carnudos vivem, com o shopping que serve de abrigo para os humanos em Despertar dos Mortos, de George A. Romero (e também na refilmagem Madrugada dos Mortos, de Zack Snyder). Meu Namorado é um Zumbi resgata um pouco das críticas sociais e ao consumismo dos filmes de Romero, apresentando uma cena hilária na introdução, que, eu aposto, deixará uma mensagem especial para a maioria das pessoas que não desgrudam das redes sociais e de seus celulares. Aliás, há ainda uma bela referência ao clássico Romeu e Julieta, quando R invade a fortaleza dos humanos (que me lembrou Terra dos Mortos, de Romero; ou Extermínio 2, de Juan Carlos Fresnadillo) e fica esperando o seu amor ir para a sacada do seu quarto.

Levine, que dirigiu o ótimo 50%, até consegue misturar romance e comédia com o universo clássico dos zumbis, mas comete o erro de ignorar a própria lógica interna de sua obra. R afirma claramente que os carnudos não conseguem falar, correr, ou fazer mais do que repetir os velhos hábitos de quando eram vivos (como o faxineiro do aeroporto que insiste em limpar o chão). Como se explica, então, a sua absurda coleção de tranqueiras escondidas dentro do avião em que vive? Ok, sabemos que o Carnudo que escolher comer o cérebro de sua vítima terá as lembranças dela, mas, sendo assim, deveriam existir outros como R. Já sobre correr e falar; na boa, eu sei que o amor transforma as pessoas (tenho conhecidos que fizeram chapinha no cabelo para agradar uma garota – claro que eles não tiveram sucesso, e ainda viraram piada na escola), mas as mudanças acontecem de maneira completamente exagerada e desrespeitosa com o que havia sido apresentado anteriormente. Assim, ao chutar o pau da barraca, Levine comete um erro horrendo, que poderá desagradar aos mais atentos/exigentes.

Um detalhe curioso sobre Meu Namorado é um Zumbi é que raramente temos uma obra em que a história é narrada através da visão de um morto-vivo. Podemos comparar com O Dia dos Mortos, também de Romero, cuja trama envolve um zumbi chamado Bud, que preserva um pouco de sua consciência. Existe também I, Zombie: The Chronicles of Pain, de Andrew Parkinson. Mas a principal referência é o trash indepentente Colin, de Marc Price. Lançado em 2008, com um orçamento de aproximadamente R$ 150, a obra narra a história de um adolescente que é mordido e passa a caminhar pelas ruas desertas de Londres. Não é um filme muito bom, mas vale pela curiosidade.

Para quem ficou surpreso com o bom gosto de Levine na escolha das faixas de seu filme anterior, uma boa notícia: o cineasta demonstrou o mesmo cuidado com a seleção musical nesse novo trabalho, e, sem a menor sombra de dúvidas, este é o principal ponto positivo do longa. Existem canções de todos os gêneros e épocas. No início, R tenta não assustar Julie, por isso coloca para tocar “Patience”, do Guns N`Roses, que relaxaria o ambiente. Evitarei estragar a surpresa, mas uma música, que é ouvida pouco antes de “Midnight City”, do M83, funciona como a melhor piada de todo o filme.

Para apreciar Meu Namorado é um Zumbi, você precisará se esforçar para ignorar tudo que já viu sobre zumbis. Os verdadeiros fãs terão dificuldades em entender como tiveram coragem de fazer um zumbi se apaixonar por uma humana, mas isso é uma subversão curiosa e interessante. O trabalho de Levine provavelmente será lembrado nas listas de grandes paródias de filmes de zumbis, como o excelente Todo Mundo Quase Morto, de Edgar Wright; Zumbilândia, de Ruben Fleischer; e Fido – O Mascote, de Andrew Currie. Ainda que não se aproxime do nível das comédias citadas, já é um grande feito para uma obra leve e descompromissada.

Poster Warm Bodies

PS: para quem imagina que o longa de Jonathan Levine seja a “crepusculização” dos zumbis, não é bem assim. Óbvio que o estúdio percebeu esse potencial na produção, tanto que Teresa Palmer chega a lembrar bastante Kristen Stewart dependendo do ângulo da câmera, mas as semelhanças param por aí. Se as adaptações dos livros de Stephenie Meyer se levavam à sério demais, ignorando o seu teor ridículo, Levine sabe o que tem nas mãos, e não tem medo de ser feliz com uma história absurda, mas, que além de bem contada, é extremamente divertida. 



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