Crítica: Roma

Assim como a maioria dos cinéfilos, sou um cliente da Netflix, gosto do catálogo de filmes e admiro a maneira como a empresa revolucionou o mercado de streaming. Mas não costumo gostar das produções originais, e é bom lembrar que as vezes a Netflix compra direitos dos filmes já produzidos e vendem como se fossem seus, como é o caso de Aniquilação e Lazzaro Felice, mas voltando ao assunto, dessa vez eles bancaram um projeto milionário e pessoal do diretor Alfonso Cuarón (Gravidade) e o resultado é nada menos do que incrível.

Baseado em suas memórias de infância, Cuarón faz uma autobiografia inovadora, ele conta um período de sua vida não por sua ótica, e sim pela perspectiva de Cleo (Yalitza Aparicio), empregada da família e para quem o filme é dedicado. Cleo é uma faz tudo, ela limpa o cocô do cachorro, lava as roupas e cuida dos quatro filhos de Sofía (Marina de Tavira). Essa premissa lembra bastante Que Horas Ela Volta?, e é triste perceber que essa exploração não é exclusividade do Brasil. E assim como o filme de Anna Muylaert, Roma também é um filme feminista, e é muito interessante observar o distanciamento que Alfonso Cuarón teve ao analisar de forma crítica sua própria família, em uma cena sua mãe chega em casa exausta e diz para Cleo que as mulheres estão sempre sozinhas, frase que as colocam em igualdade, mas em sua visão limitada ela não consegue enxergar que ela e a empregada não estão na mesma situação, afinal, Cleo sofre muito mais as consequências por além de ser mulher, ser indígena, e isso me fez pensar no discurso da filósofa Djamila Ribeiro, que alerta sobre a pluralidade dentro do feminismo que deve ser discutida a analisada.

O diretor também usa a história de Cleo para retratar um período conturbado na história do seu país, e faz isso de maneira épica, atuações emocionantes, planos sequências maravilhosos, reconstrução de uma cidade inteira em estúdio, tudo isso em preto e branco. Não é uma novidade que o cara domina grandes produções, mas neste filme ele une sua técnica absurda com uma sensibilidade enorme.

Roma ganhou o Leão de Ouro no Festival de Veneza deste ano e tudo indica que estará entre os favoritos ao Oscar de melhor filme também, justíssimo, essa obra merece qualquer prêmio que ganhe. Alfonso Cuarón é sem dúvida um dos grandes diretores da atualidade, e neste momento estou me perguntando qual filme do diretor é o meu preferido, Filhos da Esperança ou Roma, não sei dizer.