Isto é Spinal Tap!


POR RAZÕES PESSOAIS ACABEI COMPROMETENDO MINHA EXPERIÊNCIA COM UM DOS DOCUMENTÁRIOS MUSICAIS MAIS ELOGIADOS DO CINEMA. Por essas e outras que é sempre um risco misturar vida afetiva com cinema e música. Provavelmente terei sempre a lembrança negativa do documentário, por mais que segundos antes, fosse tudo um paraíso do amor e perfeição. Se for parar para pensar, uma relação amorosa é bem parecida com a trajetória de uma banda de rock como a Spinal Tap: os altos, baixos, o fim, o recomeço, e o risco constante de virar uma piada, que Deus me livre, não faz parte da vida real, embora seja o destino da maioria das bandas outrora grandes, vide Guns n`Roses.

Ignorando o papo furado sobre vida pessoal e que certamente não deveria ter servido de introdução para uma crítica de uma produção como essa, “Isto é Spinal Tap” é um documentário fake sobre a carreira de uma banda de hard rock. Dirigido por Rob Reiner (“Louca Obsessão” e “Antes de Partir”) e lançado em 1984, o filme é considerado um divisor de águas na história dos filmes que retratam o universo musical. Além de aparecer em várias listas como um dos “principais filmes de todos os tempos”, ele influenciou boa parte das produções relacionadas, como “A Todo Volume” (aquele doc com o The Edge discutindo técnicas de guitarra com Jimmy Page e Jack Black – você já assistiu, né?) e “Anvil! The Story of Anvil”, cinebiografia da banda canadense de heavy metal.

Isto é Spinal Tap” é completamente debochado e faz piada com vários elementos musicais conhecidos. Reiner não economiza nas brincadeiras e ironiza o comportamento das principais bandas de hard rock e heavy metal da época, como o Metallica e o Iron Maiden. Os estereótipos estão muito bem representados, especialmente pelo baixista da Spinal Tap, que consegue ser bizarro e ser justo o cara que fica preso em uma parte da cenografia de uma apresentação ao vivo. Existe até mesmo paródias implícitas das possíveis relações de amor que existem entre vocalistas e seus guitarristas, já que uma das grandes crises da banda acontece logo que um deles resolve bancar o John Lennon e enfia a mulher no meio da banda. Os olhares do guitarrista denunciam que existe mais que apenas raiva em suas reações e pensamentos, algo que acaba sendo ignorado por muitos fãs de algumas bandas que existem por aí. Será que as rixas não significam uma relação amorosa não-correspondida? Outra importante referência do filme está no clássico “The Last Waltz”, documentário dirigido por Martin Scorsese na década de 70. Os mais atentos perceberão que a caracterização de Reiner como o cineasta Marty DiBergi é uma clara alusão ao diretor de “Táxi Driver” e “Touro Indomável”, que como muitos sabem é um apaixonado pelo rock n`roll clássico.

Reiner foi eficiente na sua maneira de desconstruir o showbiz e chegou a irritar artistas do rock. Afinal de contas, quem é que gostaria de revelar que o segredo da “mala” está em um alimento bem posicionado? Ou que iria desabafar que já ficou preso no meio do caminho entre os camarins e o palco? A intenção de parodiar um universo apoiado no ego das pessoas é delicada, mas não deixa de ser um belo exercício para provar que as coisas não são tão perfeitas como os fãs pensam.

O filme peca por conta das várias piadas e referências ao mundo da música, que acabarão ficando sem graça para o espectador comum e que não tem conhecimento dos bastidores da indústria musical. Mesmo com esse pequeno inconveniente, “Isto é Spinal Tap” é garantia de diversão e risadas, especialmente por expor uma banda ao ridículo da decadência e se vendendo na maior cara de pau do mundo, apenas com o desejo de continuar na ativa e sendo reverenciada. Nunca o mundo da música foi tão bem apresentado no cinema.


Nota: