crítica do filme midsommar

Midsommar: O Mal Não Espera a Noite

poster midsommarO CINEMA DE BUTECO ADVERTE: A crítica do filme Midsommar possui spoilers e deverá ser apreciada com moderação.

MIDSOMMAR: O MAL NÃO ESPERA A NOITE (Midsommar, 2019) é uma daquelas experiências contraindicadas para quem detestou A Bruxa (The Witch, Robert Eggers) ou produções que zelam pela construção de uma atmosfera de medo e tensão ao invés de apelarem para sustos previsíveis, como em A Freira ou o próprio It: A Coisa – Parte 2.

Assim como em Hereditário (Hereditary, 2018), o cineasta Ari Aster parece ter a única preocupação de deixar seus espectadores transtornados e absolutamente incapazes de processar o que acabaram de assistir. E a verdade é que o diretor e roteirista consegue atingir seus desejos mesmo quando conta uma história intensa sobre um relacionamento amoroso ruim.

Midsommar apresenta um casal nada saudável, Dani e Christian, que se junta a outros três amigos para fazer um viagem para a Suécia. O objetivo do grupo é estudar uma comunidade isolada que vive no meio do nada, mas é claro que as coisas acabam ficando um pouco esquisitas demais…

Antes de analisar a questão “principal”, quero apontar o estilo de vida prático e radical das pessoas que vivem nessa comunidade. Eles vivem quatro estágios em suas vidas (assim como as quatro estações do ano) e durante essas fases recebem certas responsabilidades, como idade para foder e para cometer suicídio, por exemplo.

Aos 72 anos, os velhos participam de uma bela cerimônia de despedida e se jogam do alto de um precipício. Caso a queda não os mate, alguém com um martelo gigante dará conta do recado até deixar a cabeça dos septuagenários parecendo papel. Ou massa de tomate batida no liquidificador.

O que me chama a atenção é a forma como o roteiro discute essa questão tão séria (e tão ignorada) de envelhecer e morrer. Um personagem chega a dizer que é cultural, que eles provavelmente achariam bizarro saber que nosso hábito é colocar nossos pais/avós num asilo – sozinhos e esquecidos. Afinal, não seria o suicídio dos idosos uma forma de encerrar o ciclo da vida sem precisar passar pela humilhação ou dependência ou dor da idade?

Uma grande questão do roteiro de Aster é que ele abre inúmeras possibilidades e caminhos. Não fosse a eficiência narrativa para contar essa história envolvendo o público com seus personagens e situações, acredito que esse seria um problemão técnico. É como se a gente fosse convidado para conhecer os piores pesadelos da nossa protagonista e do seu péssimo namorado, mas ficasse apenas no portão sem conseguir se aprofundar.

Por exemplo, inicialmente, Dani é uma garota insegura que vive um relacionamento com um cara que claramente não a ama – e não sabe como encerrar o namoro. Uma tragédia familiar acaba dificultando o término e Dani é convidada para se distrair viajando para a Suécia.

Numa cena, Dani conversa com Pelle, o amigo esquisito que veio dessa comunidade sueca para os EUA, que comemora o fato dela viajar junto deles. Quando toca no assunto da morte dos pais de Dani, ela tem uma crise de choro e se retira para o banheiro. A cena corta para a própria Dani dentro do banheiro do avião, numa transição de cenas épica, que comunica claramente para o público que a personagem está passando por um momento de extrema dor emocional. (Sem falar da “turbulência” do avião, que é outra forma de mostrar mais dessa personagem)

Para coroar a instabilidade emocional da protagonista, quando os personagens chegam na comunidade, a câmera está de cabeça para baixo. Ou seja, é como se Dani estivesse prestes a entrar num mundo paralelo em que seus pesadelos vão acabar com a sua sanidade de vez ou torná-la uma pessoa completa.

Florence Pugh é o grande destaque da produção, mostrando que Aster sabe muito bem construir personagens femininas fortes e complexas. A atriz mostra com suas expressões distantes toda a tristeza de quem sabe que não é amada, mas persiste numa relação apenas por acreditar que merece esse tipo de “amor”.

Midsommar: O Mal não Espera a Noite é difícil. É complexo. É de fazer cagar tijolos e te deixar inquieto na cadeira sem entender o que acabou de assistir. Infelizmente, a parcela do público interessada em se divertir com histórias rasteiras e que não demandam muito esforço para conectar as metáforas presentes. Caso não seja o seu caso e você tenha preferência por narrativas densas, terá um prato cheio aqui.

Veja também a crítica do filme Midsommar: O Mal Não Espera a Noite no clube de cinema 365 Filmes em um Ano com uma análise ao vivo no nosso canal no YouTube:

PS: Se você gostou muito de Midsommar, também vai gostar de O Último Sacramento (The Sacrament, Ti West); O Homem de Palha (Wicker Man, Robin Hard); e O Convite (The Invitation, de Karyn Kusama), obras cuja narrativa se aproxima muito do que é visto no trabalho de Ari Aster.