Resenha: O Médico e o Monstro – Robert Louis Stevenson

(…) e foi como um pecador secreto comum que por fim cedi aos ataques da tentação (…)

O escocês Robert Louis Stevenson foi um dos inúmeros escritores geniais que mudaram os panoramas da literatura mundial. Seu talento ofereceu à arte, um caminho exorbitante e diferente de qualquer coisa que havia sido produzida antes de suas obras. “O Estranho Caso do Dr. Jekyll e Sr. Hyde“, terrivelmente traduzido para o português como “O Médico e o Monstro“, é o livro de maior prestígio lançado pelo autor e, certamente, representa o auge criativo de seu trabalho. Sua temática balança equilibradamente entre o gênero de ficção e de horror e o conjunto de seus traços, geralmente faz com que a história seja classificada como gótica e/ou byronista.

O livro apresenta a história de um médico, o Dr. Jekyll, homem de grande notoriedade no meio social e acadêmico que, em certa ocasião, atreve-se a aventurar-se em experimentos científicos ousados, que são frutos de teorias ambiciosas que o profissional sustenta. O médico acredita que o ser humano possua uma natureza dual, na qual há uma parte moralmente boa e outra moralmente cruel. Esta duplicidade seria a fórmula que compõe a interioridade essencial do homem, e ela estaria sempre travando um duelo entre si. Nas palavras do próprio Jekyll: “aprendi a reconhecer a dualidade absoluta primordial do homem (…)”. (2015, p.125).

O médico não apenas reflete sobre esta sua teoria, mas almeja interferir diretamente nesta raiz da natureza humana. Sua ideia é separar essas duas partes para tentar proporcionar alívio existencial e tornar a vida suportável. Para atingir tais objetivos, ele prepara uma dose composta por várias substâncias misturadas e ele próprio bebê a poção que criou. É a partir deste acontecimento que surge o Sr. Hyde, que na verdade, era a personificação da parte mais baixa que existia internamente em Jekyll. Era seu eu animalesco, mas ainda assim, parte de sua própria identidade. Ou seja, a poção ingerida pelo médico, trouxe à tona um eu monstruoso que ele carregava adormecido dentro de si.

O comportamento de Hyde, quando este está presente, torna-se chocante para o próprio Jekyll, pois quando o médico era controlado pela fera que ele carregava dentro de si, cometia atos perversos, liberando prazeres malignos que eram reprimidos, e agia sempre com “insensibilidade moral e predisposição insana ao mal”. (2015, p.135).

E assim, durante certo tempo, seguiu-se a vida deste ser humano: com uma divisão mental que o levava a alterados estados de personalidade. Mas seja lá quem estivesse no controle, fosse Jekyll ou Hyde, ainda assim, tratava-se da mesma alma.

Porém, todo esse contexto narrativo acima mencionado, é explicado somente nas páginas finais do livro. Antes disso, durante a maior parte da história, o leitor acompanha as investigações que o advogado John Utterson faz acerca deste caso. Ele e Dr. Jekyll se conheciam, e o médico havia lhe deixado um testamento endereçado para um homem chamado “Sr. Hyde”. Contudo, este homem que havia surgido repentinamente na cidade, era conhecido por sua tenebrosa agressividade e aparência repugnante.

Essa situação intriga Utterson: como poderia Jekyll, um homem de bons convícios sociais e de notável elegância, deixar alguma herança para um indivíduo estranho e de caráter duvidoso, que estava assombrando tantas pessoas? Dentro desse contexto, uma atmosfera de mistério e de terror, gradualmente surge guiando os rumos da narrativa.

A trajetória de questionamentos, pistas e respostas atravessadas por Utterson, é intensamente intrigante e faz com este personagem assuma o papel do próprio leitor. O personagem é movido por uma onda de assombro que aumenta cada vez mais, conforme ele se aproxima das revelações acerca dos enigmas que envolvem o Dr. Jekyll e o sinistro Sr. Hyde.

E edição utilizada para produção deste texto é da editora Penguin Companhia, se 2015 e cuja tradução é de Jordio Dauster. O livro oferece um ótimo prefácio escrito por Luiz Alfredo Garcia-Roza e uma excelente, longa e completa introdução de Robert Mighall, que é ph.D. em ficção gótica e ciência médico-legal vitoriana pela Universidade de Wales. Além destes preciosos complementos, constam inúmeras notas de rodapé que cooperam com a leitura oferecendo alguns esclarecimentos, explicações e informações sobre determinou trechos. Somado a tais observações, outro fator positivo desta edição é o preço, que é muito bom.

Ficha Técnica

Título original: THE STRANGE CASE OF DR. JEKYLL AND MR. HYDE
Tradução: Jorio Dauster
Páginas: 160
Formato: 13.00 x 20.00 cm
Lançamento: 04/03/2015
ISBN: 9788582850138
Selo: Penguin Companhia