RIDLEY SCOTT PODE TER FICADO FAMOSO FAZENDO SCI-FI, mas a sua estreia no mundo do cinema aconteceu de uma maneira muito diferente. Dois anos antes do lançamento de Alien, o Oitavo Passageiro, o cineasta adaptou Os Duelistas (The Duellists, 1977), uma história baseada na vida de dois oficiais franceses que duelaram 17 vezes em duas décadas.
Capitão Feraud (Harvey Keitel) é um homem que possui o hábito de resolver todos os seus problemas com a ponta da espada. E também não é um tipo acostumado a levar desaforos para casa. Depois de duelar com a pessoa errada, ele é comunicado por d’Hubert (Keith Carradine) que será detido por ordens superiores. Feraud se revolta com o mensageiro e inicia uma série de duelos por conta apenas do seu orgulho ferido.
Aprecio a construção dos personagens. Já na introdução, Feraud surge quase como uma rocha indestrutível em seu primeiro duelo. Como espectadores, apenas a partir da observação é possível descobrir detalhes sobre o personagem: se trata de um homem viril, orgulhoso, de poucas palavras e agressivo. A encarnação de Keitel é perfeita e ajuda a sustentar toda a obra, mas Carradine não fica atrás. Seu personagem é o oposto de Feraud em muitas coisas e isso cria um interessante conflito que move toda a narrativa.
Os Duelistas é basicamente sobre um cara orgulhoso demais que acredita que sua honra foi ferida e precisa lutar para recuperá-la. Ainda que isso signifique duelar com o mesmo adversário diversas vezes ao longo de 16 anos. Uma verdadeira loucura, mas um prato cheio para análises de personagens que se deixam levar pelo ego ao invés da razão. É uma estreia notável de um cineasta, que mostrava desde o começo uma atração pelo confronto humano, como assistiríamos em diversas outras produções ao longo de sua carreira: Russell Crowe e Joaquin Phoenix, em Gladiador; Russell Crowe e Denzel Washington, em O Gângster; Harrison Ford e Hutger Hauer em Blade Runner; etc.
Mas Os Duelistas também possui os seus defeitos, como a montagem na sequência do duelo em que o personagem de Keitel perde metade da cabeça. Pouco antes do momento do golpe, acompanhamos a perspectiva de d’Hubert lembrando de vários momentos que o levaram até aquela luta. Os cortes são bruscos demais para parecerem naturais e não imagino que isso tenha sido intencional. Scott até consegue nos fazer lembrar daquela velha frase “a vida inteira passou num piscar de olhos”, mas de uma maneira extremamente porca.
Ridley Scott é sem dúvida um dos cineastas mais versáteis da indústria e consegue trabalhar nos mais variados gêneros e estilos de produções. Das belas histórias de época até os sci-fi modernos, é possível mergulhar num universo bem particular que nos garante boas duas horas de entretenimento de qualidade. Sua estreia não deixa a menor dúvida de que ele sempre entendeu bem a arte de contar histórias.