Crítica: Parceiros da Noite (1980)

O Cinema de Buteco adverte: o texto a seguir possui spoilers e deverá ser apreciado com moderação.

Parceiros da Noite

O PROBLEMA DE ASSISTIR A MUITOS FILMES É QUE ÀS VEZES SE TORNA DIFÍCIL LEMBRAR DE TODOS. Durante a minha pesquisa solitária para selecionar os 51 melhores filmes com psicopatas de todos os tempos, me lembrei de um certo longa-metragem subestimado estrelado por Al Pacino em 1980: Parceiros da Noite (Cruising).

Dirigido por William Friedkin (O Exorcista), a recepção do filme foi bem fria e até hoje a impressão é que Parceiros da Noite ainda não recebe o merecido reconhecimento. Talvez seja consequência da polêmica gerada pela história, que narra os excessos da comunidade gay nova-iorquina no começo dos anos 1980 no começo da “epidemia” do HIV nos EUA.

Steve Burns (Al Pacino) é um policial que está na expectativa de ser promovido para detetive. Para isso, ele recebe a perigosa missão de se infiltrar no submundo gay de Nova York para investigar uma série de assassinatos. Um serial killer está matando homens que frequentam os clubes noturnos da cidade e a polícia acredita que a única maneira de solucionar o caso é com um trabalho infiltrado.

Pacino não era a opção principal do cineasta para estrelar a obra: Friedkin pretendia colocar Richard Gere como protagonista por acreditar que o ator possuía um potencial andrógino que Pacino não conseguiria transmitir. Na época, Gere ainda estava no começo de sua carreira e tinha realizado o clássico Cinzas do Paraíso, de Terrence Malick, dois anos antes. Seria realmente uma escolha ainda mais interessante, mas Pacino não faz feio e, na minha opinião, Parceiros da Noite talvez seja um de seus cinco melhores trabalhos (ao lado de O Pagamento Final, Fogo Contra Fogo, Advogado do Diabo e O Poderoso Chefão – caraca! Como é difícil fechar apenas cinco filmes!!! Lanço o desafio para quem conseguir!).

No entanto, é preciso ressaltar que Pacino realmente não tem nada de andrógino e sua tentativa de representar um gay até funciona, mas bem longe da ideia que teríamos com Gere nesse papel. Burns é um homem “duro” e quadrado. Ao se infiltrar no mundo gay, o espectador pode ter a impressão de uma pessoa fechada e tímida, quase como se ainda não soubesse lidar com a sua própria sexualidade. Tudo acaba funcionando muito bem, numa clara demonstração de que Friedkin sabia o que estava fazendo e usou o seu plano b com sabedoria.

Parceiros da Noite termina com um final aberto para causar discussões cinéfilas acaloradas. A última cena dá a entender que o próprio Burns é o verdadeiro psicopata por trás de todos os crimes, e quando lembramos que o roteiro nos dá pistas de que o assassino poderia ser alguém da polícia (numa conversa de Burns com seu vizinho Ted e também as fantasias de policiais do pessoal nos clubes gays) tudo parece reforçar ainda mais essa ideia. Gosto de acreditar nessa teoria, afinal isso transformaria Burns em um dos melhores psicopatas da história do cinema. Sem alarde ou chamar a atenção para a imagem do assassino, Friedkin constrói uma mitologia perfeita para apresentar um homem disposto a tudo para conseguir o seu objetivo de ser promovido. Somamos ainda a sua condição de policial gay homofóbico, que faz com que ele direcione a sua ira justamente contra esse público.

Com uma direção segura de William Friedkin e um desempenho excelente de Al Pacino, Parceiros da Noite é um verdadeiro clássico esquecido dos anos 1980 que nós precisamos discutir mais e recomendar para o maior número de pessoas. Indispensável para fãs de suspense e histórias com assassinos.

P.S.: O filme também se destaca por uma sequência extremamente bizarra na qual um negão gigante aparece só de cueca dentro de uma sala de interrogatório e dá porrada no personagem de Pacino. É muito WTF?!