Os Crimes de Snowtown (@festivaldorio)


GERALMENTE RELATADA COMO UMA terra exótica, conhecida pela sua natureza única, a Austrália sempre me pareceu um lugar distante com excêntricos causos e personagens. Minha vontade de ver Crimes de Snowtown surgiu da curiosidade comum que tenho com o país, somado a então mórbida atração, muito comum e pop diga-se de passagem, que casos de seriais killers nos causam. Agora imaginem a minha cara ao ler a resenha de um filme, baseado em fatos reais, sobre Seriais Killers na Austrália?

O caso conhecido como “Snowtown´s Bodies in Barrels Murders” foi solucionado em 1999, onde um grupo de pessoas foram incriminados pela morte de 12 pessoas, sendo 8 corpos encontrados em barris com ácido em um cofre de um banco abandonado na pacata cidadezinha de Snowtown. Conhecido como o crime mais brutal da Austrália, o caso reúne homofobia, pedofilia e uma liderança carismática surgindo na miséria social australiana. Outro ponto interessante é que diferentemente dos filmes que apelam para a violência e desumanidade dos assassinos em série, o filme foca suas atenções nas relações do líder dos assassinos John, com seus companheiros de crimes, principalmente com seu enteado James que é o personagem principal, e nos carrega em seus olhares aflições e traumas.

O clima do filme é pesado desde o começo, grandes descampados sob clima chuvoso e nublado, o subúrbio aonde os personagens moram é sujo, pobre, abandonado pelo governo e carregado de preconceitos moralistas cristãos comuns nas classes baixas. Nesse cenário, a existência do que a moral cristã chama de desvio de conduta (sexual) é uma bomba pronta pra explodir a qualquer momento e legitimada pelo pensamento doentio da criminalização do não-cristão. Temos então a transformação do velho “bandido bom é bandido morto” na culpabilização da pedofilia e conseqüentemente, homossexualidade, como crime. Uma homofobia concreta, real e mortal.

É importante saber que os alvos dos assassinos eram inicialmente pedófilos e homossexuais, porém aparentemente (no filme e de acordo com a mídia, por sadismo) John Bunting decidiu que qualquer um seria cabível de “ter o que merece”. Essa é uma característica que aumenta o peso do filme. A excelente interpretação dessa constante calma e sensatez de John Bunting em seus discursos junto aos seus amigos é o que dá o tom nefasto ao serial killer mais temido da Austrália, visualizar tudo pelos olhares inocentizados e débeis de James que refletem a sensação de incredulidade naquele homem que usando de uma boa lábia, empatia e carisma, cria um grupo de pessoas que o seguem, sem transformá-lo em ídolo, mas respeitando suas idéias de “limpeza heterossexual” se tornam cúmplices das mais diversas formas de seu hobby doentio. Isso, somado a ojeriza causada pela pedofilia faz entender o quão doente pode ser o homem.

Surpreendentemente e, para mais incômodo causar, não há no filme uma trasnformação do vilão principal no monstro cruel e brutal. Ele permanece o mesmo até o final da película, o que não diminui a tensão do filme. Pelo contrário, o mais díficil nesse filme é ve-lo sem imaginar que um assassino poderia estar ao seu lado com pessoas apoiando seus atos e que ele vive, aparentemente, como qualquer outro ser humano. Mas quando ninguém está olhando, ele espanca e dilacera pessoas em sua banheira, em poucos momentos explícitos, a crueldade se manifesta e aí sim a tensão se solidifica no espectador. Um fime tenso, que fez pessoas sairem do cinema, e incomoda… E essas eram as usas intenções desde o começo.

FICHA TÉCNICA:

Nome Original: Snowtown
Direção: Justin Kurzel
Produção: Anna McLeish
Sarah Shaw
Roteiro: Shaun Grant
Elenco: Daniel Henshall
Lucas Pittaway
Louise Harris
Lançamento: Mai/2011