Crítica: Gota D’água [A SECO]

No começo do mês fui pra BH tomar um Moscow Mule com o Felipe Borba, editor aqui do Buteco que me convidou pra escrever pro site e conversamos sobre a diferença de escrever sobre cinema e sobre teatro. Eu mesmo muitas vezes dou uma googlada em busca daquelas famosas listas “filmes para assistir no feriado emendado” ou “filmes que todo amante de ficção científica precisa assistir” e com poucos cliques tenho acesso ao filme independentemente da data que ele foi lançado ou do país de origem. Com o teatro não rola assim. O teatro é efêmero e isso faz parte da sua essência. Deixando de lado a função importante de registro e memória, uma crítica de teatro se faz funcional enquanto a peça ainda está sendo exibida, depois não mais.

Tudo isso pra dizer que pode parecer bobeira escrever sobre uma peça que já encerrou a temporada, mas essa obra me tocou tão fundo que resolvi escrever mesmo assim. Mesmo porque essa não foi a primeira temporada, então há esperanças de que o trabalho perdure e meus votos são de vida longa à essa obra tão potente.

Gota D’Água [a seco] repensa a obra de Chico Buarque para que em cena estejam apenas os dois protagonistas: Joana e Jasão. A adaptação de Rafael Gomes, que também assina a direção, ainda acrescenta mais músicas de Chico Buarque e se faz potente na capacidade de manter a história mesmo tirando vários personagens de cena. Laila Garin solta sua voz que nos atinge com a mesma intensidade de sua impecável verdade e peso que dá à sua Joana. Alejandro Claveaux , na pele de Jasão, brinca pelo cenário com uma habilidade de encher os olhos, construindo o jovem sambista que deixa dois filhos em nome de seu sucesso. Os dois jogam em cena nos ajudando a construir o relacionamento do casal e nos revelando aos poucos, com a beleza do texto, os desafios que enfrentam. A cena da visita de Jasão à Joana é belíssima e acerta em tudo.

O cenário que pode parecer um pouco sem função no começo, mostra sua versatilidade no decorrer das cenas, e compõe em nossa imaginação. A luz é estonteante, criando atmosferas precisas e pinta a cena de forma bela. A força crítica de Chico Buarque não fica em segundo plano e a peça da década de 70, por sua vez inspirada na Medéia de Eurípedes lá da época antes de Cristo, se faz atualíssima e levanta importantes discussões. Uma pena que só conferi no derradeiro dia da temporada, despeito os insistentes avisos de amigos.

Vale a pena ficar de olho na página do facebook  do espetáculo e não marcar bobeira quando voltarem aos palcos.