Doce Vingança

O filme Doce Vingança, do diretor Steven R. Monroe, de doce não tenha nada. Nem a imaginação do responsável pela péssima escolha do título da versão brasileira para I spit on your grave (Eu cuspo no seu túmulo – um nome bem mais apropriado para o que vemos na tela).
De toda forma, Doce Vingança é um remake do trash de 1978 I spit on your grave (A Vingança de Jennifer), que conta a história da escritora Jennifer Hills (Sarah Butler) que resolve se enfiar numa cabana no meio do nada, longe de que qualquer traço da “cidade grande” e da boa e velha civilização, para poder iniciar seu novo livro. No caminho ela para no posto de gasolina (perdida!) atrás de informações. É ai que conhecemos Johnny (Jeff Brason) e seus três amigos, que decidem dar um susto na moça metida da cidade grande invadindo sua cabana no meio da noite.
Resumo ‘bonitinho’, com uma história sem sal e sem muita polêmica para mostrar. Mas o filme consegue descer em níveis muitos mais baixos do que as linhas anteriores mostram. O “susto” que veremos, vai muito além do que estamos acostumados a ver na tela. Podemos dividir o filme em 3 partes:
1ª – Apresentação: os 15 minutos iniciais consegue ser eficiente ao nos apresentar os personagens e o local onde se passará boa parte da trama de modo que possamos nos ambientar e possamos imaginar com a personagem os possíveis pontos de fuga. Além de criar um clima eficiente de tensão onde a personagem principal se sente em alguns momentos vigiada mesmo sabendo que se encontra “isolada do mundo”.
2ª – Conflito: nisso podemos colocar os próximos 40 ou 50 minutos do filme. È o momento que o Johnny e seus amigos (ajudados pelo xerife local!!!) pregam o susto na moça metida da cidade. Aqui o clima de tensão é jogado no lixo, e o “susto” que esperávamos ver é transformado numa longa (quando digo longa, é longa MESMO) seqüência de humilhação, agressão física e estupro. – [para imaginar tão forte é, eu contei em torno de 7 ou 8 pessoas saindo do filme antes do fim dessa sequencia]
3ª – Desfecho / Vingança: que é o restante do filme onde Jennifer promove a volta dos que não foram e inicia sua vingança contra cada um dos homens que a violentaram.
Acredito que os elementos acima já são o suficiente para a criação de um trash do terror/suspense. Mas isso torna o filme uma boa experiência? Isso vai depender do tamanho da sua psicopatologia (tá, eu sei que estou exagerando), mas Doce Vingança é um filme que foi feito para causar um incômodo. Não o mesmo incomodo que temos ao assistir o Anticristo de Lars von Trier, onde toda a violência mostrada tem um respaldo nos problemas e conflitos psicológicos dos personagens; mas um é incomodo provocado pela violência gratuita sem nenhuma justificativa, encontrando amparo apenas no lado mais sádico de quem assiste, sem nos apresentar nenhum motivo dentro da historia e do desenvolvimento dos personagens que explicassem tal escolha. Por exemplo: o diretor opta por estender a cena de estupro até o limite do suportável de forma assustadoramente clara e real, com o objetivo de… (se alguém descobrir, me conta depois)?
Claro que o expectador vai ficar do lado da heroína (o mais correto seria chamá-la de anti-heroína) seja por identificação com a personagem (espero que não seja o caso de ninguém) ou por pura revolta com tamanha violência e humilhação. É ai que vemos a continuação da série Albergue com a personificação feminina de Jigsaw (Jogos Mortais), que a volta de Jennifer para se vingar suas dores e cada um dos que a violentaram. E ela o faz de modo tão frio e cruel quanto fizeram com ela. [se você já viu Albergue e Jogos Mortais, já pode ir imaginando as mortes que se sucedem na parte final do filme]
Doce Vingança não é um filme para se assistir várias vezes e ao escrever essa resenha rasguei todas minhas anotações sobre o filme, e tentando refletir o quão não benéfico é para o expectador a sensação de incomodo que o filme causa (e não acrescentar nada na vida de ninguém) entre nosso racional e nossos extintos mais baixos, ao nos mostrar que podemos nos satisfazer com a dor alheia (como o mesmo exercício mórbido de nos reunirmos em torno de uma pessoa que acaba ser atropelada) e nos sentir livres de culpa por saber que aquilo não é “real”.