Crítica: Estrelas Além do Tempo (2016)

SABE AQUELE TIPO DE FILME QUE SE DESENVOLVE COM UM RITMO ENVOLVENTE e cativa o público pela sua simpatia? Isso costuma acontecer quando os diretores são exímios contadores de histórias e trabalham com excelentes montadores. Em 2015 tivemos o vencedor do Oscar de Melhor Filme em 2016 Spotlight: Segredos Revelados como o exemplar de produções deliciosas de se assistir. O representante da vez é Estrelas Além do Tempo (Hidden Figures, 2016), de Theodore Melfi.

Indicado a três prêmios da Academia, o longa-metragem conta a história de três mulheres negras iniciando seus trabalhos na NASA, numa época em que a segregação racial era muito forte nos Estados Unidos. Com seus méritos profissionais, o trio acaba se destacando e criando um forte conflito: será que a cor da pele é o suficiente para impedir alguém de desempenhar o seu trabalho?

Estrelas Além do Tempo, ao lado de Nascimento de Uma Nação e Moonlight: Sob a Luz do Luar, faz parte do trio de obras indispensáveis quando se fala em combate ao racismo e preconceitos. Não gosto de usar esse tipo de argumento de que tal filme é mais importante por fatores externos e sociais do que pelas suas qualidades, mas é o caso aqui. Mesmo com a fluidez narrativa de se tirar o chapéu e o belo trabalho do elenco, Estrelas Além do Tempo não possui outros grandes méritos técnicos. Simplesmente foi o filme certo, na hora certa e conquistou o público m com a sua simpatia e simplicidade.

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Octavia Spencer interpreta Dorothy Vaughan e foi a única atriz do elenco indicada ao Oscar. Amada ou odiada pelo público na mesma proporção, ela faz aquilo que já estamos acostumados. Tem sempre a mesma cara de deboche que inexplicavelmente possui muita simpatia. Geralmente não sou fã da atriz, mas hoje, especialmente, meu coração me impede de reclamar. No entanto, Spencer é a “pior” das três atrizes principais. Inexplicável ver a ausência de Taraji P. Henson na lista de indicações, já que ela dá um verdadeiro show de interpretação, e o mesmo pode ser dito da cantora Janelle Monáe (que também poderia ter recebido uma indicação por Moonlight), uma surpresa bem-vinda no mundo do cinema.

Me incomoda um pouco a ideia de ter Kevin Costner como o branquelo responsável por quebrar as barreiras do preconceito na NASA. Alguém realmente tinha que fazer isso, claro, mas existe algo meio forçado em ter um antigo galã desempenhando esse papel. Não que houvesse outro personagem capaz de ter a força moral de se revoltar contra o racismo, mas me soou pouco convincente ver isso partindo de Costner. Inclusive, ele é responsável pela grande frase de efeito: “Aqui na NASA somos todos da mesma cor”. Posso estar enganado ou sofrer com os reflexos da manguaça, mas precisava mesmo ser o Guarda-Costas levantando a bandeira do bem? O tempo inteiro ele banca o bom samaritano, o cara fora da curva, mesmo com a obsessão pelo trabalho, mas o personagem não é tridimensional, parece existir apenas naquele ambiente, e isso faz que seja pouco natural. O que explica o desconforto com sua posição de herói – embora seja extremamente importante.

Esse é o lançamento mais gostoso de assistir dessa temporada de premiações. Com seus méritos e defeitos, acaba sendo uma bela opção de entretenimento para o público interessado apenas em se distrair com uma boa história e poder indicar para os amigos nos butecos da vida. Talvez até os cinéfilos mais chatos podem se permitir apreciar o trabalho de Melfi.