Filme: O Quarto de Jack (2015)

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Um quarto que é o mundo de mãe e filho por vários anos e é um dos palcos da história comovente do drama O Quarto de Jack (Room, Irlanda/Canadá/Reino Unido, 2015). Indicado ao Oscar, o filme de Lenny Abrahamson é uma maneira profunda de explorar a maternidade, com atuações brilhantes de Brie Larson e Jacob Tremblay.

Eu divido a produção em duas partes: quarto e mundo real. Não que o cativeiro não fosse uma realidade para os personagens, mas porque a adaptação deles após saírem do local é um balde de água fria mais complicado do que eles podiam imaginar. Aquele espaço foi a vida deles durante cinco anos, mas cinco anos sem ver o exterior do local, apenas com uma pequena visão do céu por meio de uma claraboia. Além de uma televisão, brinquedos e suprimentos trazidos pelo velho Nick (Sean Bridgers) semanalmente. O único contato humano, de carne e osso, deles foi o homem que sequestrou Joy (Larson) quando ela tinha apenas 17 anos. Ou seja, foi o mundo deles, mas um mundo fantasioso com o qual foram obrigados a lidar.

A maneira que Abrahamson nos insere na rotina dos protagonistas é bem interessante. Ele mostra todo o processo de acordar, tomar café, escovar os dentes, brincar e aprender de Jack, e as tarefas domésticas de Joy, que incluem lavar roupa, preparar comida, limpar a casa e receber Nick quando ele aparece no quarto. Nesses momentos, a jovem deixa o filho dormindo dentro de um armário, uma vez que o homem vai lá para estuprá-la e ela não quer que ele tenha nenhum contato com o garoto. Com toda essa narrativa, o diretor consegue nos envolver com a trama e nos fazer roer os dedos no momento em que ela põe em ação o plano para tirá-los de lá.

A química de Larson e Tremblay é um dos motivos pelos quais nos conectamos com a história apresentada na tela. Eles estão não só convincentes em suas cenas juntos, como também nas partes individuais. Ele como uma criança que não tem noção alguma do que o quarto significa (ele cria uma conexão forte com o mesmo) e de tudo que sua mãe enfrenta há tanto tempo; Jack age como se aquele fosse o mundo que lhe foi ensinado quando era mais novo e vive ali como se fosse um lugar qualquer. Ela age como uma mãe amável, mas que já está extremamente angustiada com a situação e mal espera para tirar pelo menos a criança dali.

Acho que apenas alguns detalhes deixaram o roteiro um pouco a desejar. Por exemplo, o fato de Joy ter sido estuprada é praticamente ignorado no longa, assim como a participação do pai Robert (William H. Macy) na trama, que não aceita o neto por ser fruto de uma agressão. Era uma oportunidade ótima para falar sobre o tema na tela, mas a autora Emma Donoghue (que também escreveu o livro no qual o filme é baseado), optou por focar mais nas dificuldades de adaptação da jovem, como uma entrevista – ridícula – que dá a uma jornalista totalmente sem noção ou uma breve discussão que tem com a mãe e Jack. Fica clara a depressão de Joy após ser libertada, mas poderia ter sido feito mais a respeito disso.

O desaparecimento de Nick é algo que ficou mal trabalhado na adaptação também, já que ele é o grande vilão da história. Ele não só estupra e mantém mãe e filho reféns, como também faz maldades com ambos. Nós torcemos para a hora dele ser preso, mas nunca vemos isso acontecer. Não vemos nem a aflição de Joy enquanto espera o resultado de seu plano e o provável medo da reação de Nick quando ele chegar em casa após a fuga de Jack. Nada.

Por outro lado, ganhamos bastante com as cenas de Jack com a avó Nancy (uma esnobada Joan Allen na temporada de premiações) e seu parceiro Leo (Tom McCamus). A adaptação dele à sua nova realidade é bem mais tranquila que a de Joy e como ele interage com os dois adultos é um dos pontos mais comoventes da segunda parte do filme. Vemos ele se transformar aos poucos, indo do garoto que não quer cortar os longos cabelos e sair de perto da mãe, para um filho que resolve abrir mão do cabelo e começa a se abrir para quem está à sua volta. Tremblay está impecável e me parte o coração não vê-lo receber uma indicação de melhor ator.

O Quarto de Jack conquista principalmente em função das atuações do elenco e da dinâmica entre os protagonistas, que funciona perfeitamente nas lentes de Abrahamson. E a história de amor entre mãe e filho não deixa de ser um tema universal que vai comover muitos, ainda mais nas circunstâncias do filme.