Filme: O Regresso

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Leonardo DiCaprio já interpretou tudo quanto é tipo de personagem: drogado, deficiente mental, presidente, aviador, policial, invasor de sonhos, dono de terra racista, milionário…enfim, a lista é enorme. Agora, chegou a vez dele renascer dos mortos em uma atuação poderosíssima em O Regresso (The Revenant, EUA, 2015).

A produção de Alejandro González Iñárritu é sustentada por duas coisas: elenco e visual. Elenco porque o diretor explora em profundidade as emoções dos personagens naquele contexto de guerra entre caçadores e tribos indígenas, no qual o medo, estresse, desconfiança e ganância toma parte. Visual porque a maneira que a história é narrada nos envolve naquela jornada de superação, vingança e total esforço físico do personagem central. Câmeras fechadas em seu rosto e feridas, gritos de dor e raiva, o frio daquele inverno rigoroso, câmeras que nos colocam juntos dele em conflitos e giram por todos os lados transmitindo sua dor e desespero.

Não vou mentir: temos um filme bastante longo (cerca de duas horas e meia) e duro. Quando digo duro, digo tanto no que diz respeito ao físico quanto às imagens. Temos muita violência e personagens tentando sobreviver a qualquer custo, além de muita dose de maldade. Fitzgerald (Tom Hardy) está ali para ser o vilão que todo mundo odeia e quer que seja morto no final. Seu egoísmo e ganância o tornam uma pessoa extremamente maquiavélica, capaz de matar quem entra no seu caminho. Escolheram o ator perfeito para tal porque Hardy está impecável na tela.

Por causa dessa narrativa, Iñárritu é muito bem-sucedido em nos ambientar naquele mundo sombrio e intenso; é como se estivéssemos junto de Glass e percorrêssemos com ele sua jornada aparentemente inacabável. Chega a ser irônico como ele sofre cena após cena e arruma maneiras de se virar nas situações mais difíceis. Mas aí que tá: quando isso acontece conosco, somos forçados a fazer coisas que jamais iríamos fazer sem nenhuma pressão. O homem é totalmente movido à sua sede de vingança e instinto de sobrevivência.

Uma das cenas em que mais me surpreendi foi uma em que o protagonista cai de um abismo com um cavalo, no meio de uma tempestade. O animal morre e ele começa a cortar e retirar seus órgãos e carne, comigo pensando que ele iria comer algumas partes. Não, ele retira tudo para depois entrar no animal e se esquentar. O comprometimento de DiCaprio na pele desse homem, em todas essas cenas bizarras, é emocionante.

O único defeito de O Regresso está em seu roteiro. Apesar de Glass ser uma pessoa real, tivemos várias alterações que não necessariamente caíram bem a meu ver. A família de Glass nunca foi algo comprovado, muito menos o filho. O filme nos conta que o principal motivo dele ter se vingado de Fitzgerald foi o assassinato do jovem fruto de sua relação com uma índia. Entendo o motivo de inventar essa família para humanizar mais o personagem principal, mas a jornada dele já não foi sofrida o bastante? Mas isso não foi o pior.

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O desfecho da produção ficou um pouco happy ending demais. Eu sei que foi a intenção do diretor nos deixar com uma vontade gigantesca de vingança e nos relacionar com a batalha de Glass, mas a escolha feita na história ficou clichê demais; ainda mais porque não foi o que aconteceu na verdade. Pareceu mais um prêmio para toda a luta enfrentada até então e um desejo de agradar o espectador na minha opinião.

O que faz de O Regresso um ótimo filme é sua narrativa realística e envolvente de uma história de total superação e sobrevivência. Com uma fotografia de tirar o fôlego nos quesitos cor e movimentos de câmera e um elenco extremamente comprometido (destaque para Will Poulter e Domnhall Gleeson), Iñárritu nos proporciona uma experiência única. Não vou repetir a sessão porque é muito pesado para eu ver de novo, mas não quer dizer que não apreciei essas duas horas e meia de belíssima sétima arte.

E sim, DiCaprio merece vencer o Oscar. O papo dele vencer porque “está na hora dele” é furado para mim.