A Menina Que Roubava Livros

a menina que roubava livros 2EIS UM PEQUENO FATO: os fãs mais xiitas do livro A Menina Que Roubava Livro ficarão “#chateados” com o resultado da aguardada adaptação do principal romance do autor australiano Markus Zusak. Reação ao fato supracitado: quem não leu, talvez consiga embarcar na fantástica história da jovem orfã Liesel Meminger e se divertir o suficiente para se interessar em conhecer o original. Isso sendo muito otimista, claro.

Antes do primeiro comentário educado me lembrando que cinema e livros são mídias diferentes, algo que todos sabemos e eu já dei uma opinião mais aprofundada na crítica de O Hobbit: A Desolação de Smaug, é praticamente impossível se manter indiferente quando ficamos diante da adaptação de um dos nossos livros favoritos. No entanto, tentarei me esforçar para concentrar a minha avaliação apenas no longa-metragem (independente dele ser muito, muito, muito, muito inferior ao livro).

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Como leitor fiquei numa mescla de frustração com alegria pelas escolhas da produção. Existem modificações chatas na trama, mas no geral o roteiro é bem leal ao trabalho de Zusak. A mãe adotiva de Liesel deixa de ser uma figura curiosa (imaginem uma versão alemã sem tanta graça da Dona Hermínia, de Minha Mãe é Uma Peça) e se torna apenas uma mãe comum. E nem precisamos falar do momento ridículo e adolescente em que Liesel diz que irá fugir. Uma invenção do roteiro que é descartada com a mesma facilidade em que surge. Seria injusto dizer que todas as modificações (as que me recordo, pelo menos) foram ruins: em determinado momento do livro, a pequena orfã encontra uma cópia de O Dar de Ombros, que é substituído no livro por O Homem Invisível, de H.G. Wells. Uma escolha acertada para fazer a metáfora introdutória do judeu Max. E somente essa alteração é digna de nota.

A desconhecida Sophie Nélisse faz uma Liesel surpreendente, mas o elenco não é o forte de A Menina Que Roubava Livros. Talvez por culpa das mudanças nas características básicas dos personagens originais. O fato é que Emily Watson e Geoffrey Rush parecem atuar no piloto automático e sem a menor disposição de oferecer performances inspiradas como em outros trabalhos de suas carreiras. Como se estivessem lá de favor ou para pagar alguma dívida com algum produtor. Felizmente, existe ainda a divertida narração da Morte (que foi sabiamente escondida durante os trailers para dar a impressão de que não estaria no filme – causando arrepios nas espinhas dos fãs) e a atuação do pequeno Nico Liersch, na pele de Rudy.

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Outro “probleminha” de A Menina Que Roubava Livros é a inexperiência do seu diretor Brian Percival, que havia dirigido apenas episódios de algumas séries norte-americanas. Como se não bastasse desperdiçar o talento de um ator como Geoffrey Rush, Percival ainda peca na falta de ritmo (não recomendo assistir ao filme quando estiver cansado) e demonstra uma inaptidão para emocionar. Com um drama tão pesado como o da vida de Liesel, e da Segunda Guerra Mundial, qualquer diretor mais calejado seria capaz de arrancar lágrimas facilmente dos espectadores. Claro que a culpa aqui pode ser dividida com o compositor John Williams, que só se fez reconhecer quando o seu nome apareceu durante os créditos. Outrora um mestre da arte de emocionar, hoje ele é uma sombra que continua trabalhando apenas para fugir da aposentadoria.

Um dos motivos para o fracasso pode ser explicado também no roteiro pouco objetivo e que se atrapalhou inteiro na ânsia de ser fiel. Michael Petroni (O Ritual) errou a mão e, junto do diretor, criou uma narrativa em que os personagens são jogados de maneira pouco convincente e nada natural. A apresentação de Max, por exemplo, é um completo engano e oferece momentos em que o roteiro parece flertar com um thriller de espionagem (“Encontre-o!”). Qual o sentido? A própria relação de Liesel com seus familiares deixa muito a desejar. Na verdade, todas as relações dos personagens soam vazias e superficiais. E para uma adaptação de um livro que se esforçou tanto para nos fazer entender (e se apaixonar) por Liesel, esse é um erro fatal.

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A Menina Que Roubava Livros poderia ser genial, mas é apenas medíocre. Seus defeitos incomodam mesmo quando você se esforça para opinar sem levar em consideração o romance original que inspirou o roteiro. Liesel Meminger e os personagens criados pela imaginação fértil de Markus Zusak mereciam uma atenção maior dos estúdios, que preferiram apostar num projeto menor e colocar um cineasta desconhecido atrás das câmeras. O resultado não poderia ser outro, não é mesmo? No entanto, para quem ainda não conhece a história do livro, essa é sim uma boa oportunidade de conhecer a obra e talvez se aventurar no verdadeiro universo da pequena roubadora de livros.

Eu, como um mero assistidor de filmes, me despeço dizendo que certas adaptações me assombram. E não do jeito que deveriam.

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Título original: The Book Thief
Direção: Brian Percival
Gênero: Drama
Roteiro: Michael Petroni
Elenco: Sophie Nélisse, Geoffrey Rush, Emily Watson
Lançamento: 31/01/2014
Nota:[tres]