Quem Vai Ficar Com Mary?

Talvez Quem Vai Ficar Com Mary? tenha sido o primeiro filme que fui ver sozinho no cinema. Infelizmente perdi o caderno que mantinha registrado os filmes que havia visto nas salas mineiras, em sua maioria no BH Shopping e sempre acompanhado de minha avó. Me lembro que enquanto esperava na fila, senti aquele friozinho na barriga. Parte dele era por conta de estar no cinema sozinho (aquele era um filme bobo demais e que a minha avó não se interessou nadinha) e a outra parte era por conta das menininhas que estavam próximas e eventualmente lançavam olhares e risinhos em minha direção. Enquanto muitos aproveitariam a oportunidade para interagir, me encolhi e fingi que não era comigo. Em 1998 eu tinha apenas 13 anos e mesmo naquela época já levava o cinema muito a sério (sim, eu sou um daqueles que se concentra seriamente no filme e ignora a companhia. só “aloprei” no cinema por três ou quatro vezes. mas ainda não cheguei a fazer nada demais, mas é um fetiche que será realizado em breve) e não havia motivo para desviar a atenção naquele momento. Principalmente porque Cameron Diaz já era a minha musa e principal razão de eu ter resolvido ver o filme na tal sala 3 do cinema do principal shopping de BH.
Como é normal na idade, os meus hormônios ferviam. Engraçado que o que poderia impulsionar uma atitude mais atrevida com as meninas da fila, acabou sendo minado por outra coisa que fervia na época e se mantém até hoje: a timidez. Então foi fácil me identificar com o personagem interpretado por Ben Stiller. A completa falta de jeito para conversar com uma mulher me persegue até hoje e praticamente me vi naquela cena em que Ted convida a ruivinha para ser sua companheira no baile de formatura. Ele falava aos trancos e barrancos, bem lentamente, e quando ela demorou para responder, simplesmente mudou de assunto bruscamente. Aquele roteiro conseguiu captar exatamente o que se passa no interior de um jovem diante a sua “musa”. A constante sensação de se perguntar “Será que estou sendo um idiota? Será que ela vai aceitar sair comigo? Cara, o que diabos estou dizendo? Sério que eu acabei de exclamar “Quantas lojas, né?” dentro de um shopping?”, toda aquela insegurança praticamente berrando na sua cabeça e o mundo todo conspirando contra. E então, quando tudo parece perdido e você começa a pensar que vai ter que levar a sua própria irmã para o seu baile de formatura, o seu coração para e você descobre aquela pessoa que faz o seu coração virar a bateria do Olodum. Que homem nunca deu um daqueles sorrisos idiotas, enormes e intermináveis depois de ouvir um comentário positivo de uma bela mulher? Somos completamente vulneráveis aos feitiços dessas criaturas dotadas de bocas convidativas, olhos verdes dominantes e cabelos macios e cheirosos. Quando Mary praticamente intima Ted para irem juntos ao baile, ele se derrete todo. Incapaz de acreditar na sua sorte. O retrato perfeito do sonho adolescente. Nós quase conseguimos sentir as borboletas na barriga do personagem. ´E como se fosse a nossa história, e acreditem, não é toda moça que causa essas reações. Elas são raras e algumas pessoas são incapazes de continuar sentindo isso ao longo dos anos e sempre com a mesma pessoa em mente. Ted foi um exemplo disso, tanto que treze anos depois do baile que não compareceu (graças a um desastroso acidente no banheiro da casa de Mary), ainda sentia uma forte atração pela amiga. Lógico que se fosse na vida real, ele seria taxado de maníaco sexual. Mas é o cinema e sua licença poética. Aliás, acima dessa licença, temos que ter em mente que se trata de uma comédia politicamente incorreta dos irmãos Farrelly.
O que fazer então para driblar esse problema e evitar brincar com a inteligência duvidosa do espectador que se sujeita a ver um filme desses? Eles criaram então o personagem de Matt Dillon, que esta a cara do Jim Carrey. Canastrão, safado, arrogante e peidorreiro, Pat Healy é um detetive particular que recebe a missão de encontrar Mary. O problema é que, para a tristeza de Ted, ele se apaixona pela loira. Mais um personagem que se encanta por Mary e assim como acontece na vida real, parece que a qualquer momento, outra pessoa vai perceber o que a sua própria Mary tem de especial e poderá rouba-la dos seus braços. De novo a insegurança falando mais alto. Uma vez eu ouvi uma pessoa falando sobre como a vida seria mais simples e gostosa se não houvesse expectativas em relação a sua companhia. Em como seria se tudo se resumisse aquele momento. Achei genial. Mas fiquei dividido, pois como é que se controla aquelas borboletas que descansam em nossas barrigas? Quando elas acordam, parece que elas começam a voar por todos os lados e saem até mesmo pelos nossos narizes. Viver sem expectativas, sem esperanças, sem medos é muito bom, mas muito sério e complicado. Descobri um caminho diferente daquele que sigo desde a época em que vi chorava de rir (este foi um dos filmes em que mais ri dentro do cinema. em breve publico um top 5 com os outros) com Quem Vai Ficar com Mary? e suas piadas non-sense para o uso do esperma e ainda não decidi se vale mesmo a pena ser assim. Certamente, o equilibrio seria bem mais proveitoso. De qualquer forma, a lição final do filme acaba sendo essa mesma. Você investe pesado em uma paixão, sofre com a violência física e mental, tem o coração partido em mil pedaços, se apaixona novamente e segue em frente até que é obrigado a abrir mão de sua própria felicidade apenas para fazer o bem para quem se ama. Quem Vai Ficar Com Mary? é uma das histórias de amor mais bonitas do cinema e são poucas as pessoas que conseguem entender a mensagem por baixo de toda a baboseira que os irmãos Farrelly escreveram. O amor é cru, violento e consome nossa alma por inteiro. Inesquecível.