Crítica: Tristeza e Alegria – Mostra de SP

TRISTEZA E ALEGRIA

38ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo #39

Não é spoiler, pois nos é informado na primeira cena da projeção – e se você não quiser descobrir ainda, nem comece a ler este texto antes de ver o filme: o tema abordado por Tristeza e Alegria, o candidato dinamarquês a uma vaga no Oscar de Melhor Filme Estrangeiro m 2015, é daqueles chocantes e assustadores que, como em Perder a Razão e Miss Violence, ambos exibidos em edições recentes da Mostra, nos dão um soco na cara e levam-nos a começar imediatamente a buscar distrações mentais que não nos permitam pensar muito em sua natureza brutal. Mas ao contrário dos filmes recém citados, este não consegue ser 100% eficiente justamente por lidar com uma história autobiográfica do próprio roteirista e diretor Nils Malmros, que se por um lado revela coragem ao cutucar a própria ferida, por outro não consegue evitar ser um pouco condescendente.

Trazendo o ator Jakob Cedergren como alter-ego de Malmros, Tristeza e Alegria o apresenta como o cineasta Johannes, que, certo dia, ao chegar em casa, descobre que sua esposa Signe (Fagralid) assassinou a filha de dezoito meses com uma facada no pescoço. A partir daí, o roteiro se divide em duas linhas narrativas paralelas: enquanto voltamos no tempo para descobrir como os dois se conheceram e iniciaram aquele relacionamento, acompanhando o desenvolvimento dos transtornos psicológicos de Signe e da tensão erótica entre Johannes e a adolescente Else (Dwinger), que protagonizará um de seus filmes, assistimos às sessões de terapia do protagonista com seu analista (Bro).

Prenunciando sua tragédia já na primeira imagem que vemos projetada na tela, quando a casa de Johannes e Signe surge mergulhada em sinistras sombras, Malmros (com a colaboração do diretor de fotografia Jan Weincke) pinta o mundo desiludido em que seus personagens vivem de tons marrons, bejes e cinzentos que parecem, por si sós, um convite à depressão. Optando por não mostrar o crime ou mesmo o cadáver do infante assassinado (a não ser pela sugestão de sua cabeça em perfil), o diretor é bem sucedido tanto em criar o clima fúnebre que o primeiro ato pede quanto em estabelecer a relação de Johannes e Else de forma sutil e elegante, como ao criar um plano em que o protagonista se vê no filme-dentro-do-filme observar cheio de desejo as fotos que a garota tirou para o filme-dentro-do-filme-dentro-do-filme.

É uma pena que, na tentativa de absorver Signe – e consequentemente a própria esposa – do crime bárbaro que cometeu, Malmros não se contente em tratá-la como vítima de um distúrbio psiquiátrico que amorteceu sua consciência e a levou a fazer o que fez (algo possível, mas ainda assim passível de tratamento e punição), incluindo situações absurdas como a dos pais dos alunos da mulher que fazem um abaixo assinado para mantê-la no cargo mesmo depois de conhecerem os detalhes sórdidos de seu ato e praticamente eliminando as consequências psicológicas da perda do bebê nos dois personagens principais a partir do momento em que o longa deixa de se tratar sobre a tragédia e passa a focar na reconstrução do relacionamento conjugal entre os dois.

Lançando a jovem Ida Dwinger como uma promessa, Tristeza e Alegria segue a influência dinamarquesa do Cinema de Lars Von Trier e principalmente Thomas Vinterberg ao mostrar uma única perspectiva pela qual o espectador deve vê-lo e interpretá-lo, desperdiçando a oportunidade de mergulhar em um estudo profundo nos recônditos da psique de um assassino impiedoso.

Tristeza e Alegria (Sorg Og Glæde Dinamarca, 2013). Escrito e dirigido por Nils Malmros. Com Jakob Cedergren, Helle Fagralid, Ida Dwinger, Kristian Halken, Nicolas Bro, Helle Hertz, Niels Weyde e Søren Pilmark.