Direto do Indie 2011 Parte 1: Flores do Mal



A CAPACIDADE DO JOVEM CONTEMPORÂNEO DE SE RELACIONAR COM O MUNDO ESTÁ CADA VEZ MAIS ATRELADA A UMA NECESSIDADE DE MEDIAÇÃO DA INTERNET. Conhecer o mundo, as pessoas, o outro, estabelecer estes laços passa necessariamente pelo mundo virtual, as redes sociais e os sites de procura, o que faz com que novas dinâmicas se estabeleçam e novas formas de se situar na realidade se coloquem. Está é a temática de Flores do Malfilme de estréia (em longa metragens) do diretor David Dusa, exibido ontem no Indie Festival.

Logo na primeira cena do filme, vemos a movimentação em Paris, o trânsito, a vida acontecendo, enquanto  Gecko (Rachid Youcef) acorda para mais um dia de trabalho. O silencio de seu quarto em contraposição ao mundo para além de sua janela mostra que esta conexão com aquilo que está lá fora não é algo automático. Acontece quando ele acorda e imediatamente se conecta ao Facebook. Depois ao Google para saber mais sobre engarrafamentos. E depois para saber sobre o Irã, onde existem muitos engarrafamentos. São estas ligações, links para falar num termo mais apropriado, que caracterizam este contato do jovem com a internet: as relações estabelecidas podem ser e são inúmeras, e por isto mesmo rápidas e efêmeras.

É do Irã que vem a garota que conhece no elevador do hotel onde trabalha. Anahita (Alice Belaidi) foi enviada à Paris pelos seus pais para que se protegesse da represália que a juventude iraniana estava sofrendo por parte dos policiais locais. Quando abordada pelo jovem, ela se abraça ao laptop. É como se ela estivesse se escondendo por detrás da máquina, única possibilidade de fazer com que seus laços com sua terra natal se mantivessem. É através dos vídeos do You Tube que ela se sente mais próxima daquele lugar, dos acontecimentos (violentos) e das pessoas que ama.

Há alguma ligação entre os dois, que rapidamente se transforma em amor, em refúgio. A solidão de Gecko e Anahita os aproxima, e depois de uma conversa pela internet acabam se encontrando. O que seria apenas um passeio turístico pela cidade se transforma numa relação de carinho e companheirismo. Ambos tem suas histórias, suas dores e marcas, e sobretudo suas perdas. Cada um tenta se afirmar no mundo de uma forma. Ele, pela dança. Ela fica entre o lugar que estava e a revolução que pode lhe tirar amigos e parentes que ama e o novo lugar onde pode ser livre, como aquele dançarino de rua pelo qual se apaixonou.

O tempo todo somos colocados entre as imagens “reais” (aquelas concebidas pelo diretor) e as imagens virtuais que não estão apenas nos vídeos que Anahita vê, mas também no olhar dos personagens, e quando estas imagens reais se fundem com a virtualidade da expressão daqueles sentimentos (através do twitter e do “what’s happening“) vemos que a linha que separa estes dois lugares, aquele da vida na França e no Irã, e aquele na internet, está cada vez mais indissociável.

Uma história de amor genuinamente contemporânea, com todos os conflitos e percursos inerentes a isso, Flores do Mal é um filme singular e ousado na sua abordagem, embora trate o amor à moda antiga. Uma das primeiras grandes surpresas do Indie desde ano.




Fleurs du Mal (2011)
Diretor: David Dusa
Roteiro: David Dusa, Raphaëlle Maes, Louise