O melhor do cinema nacional em 2016

O Cinema de Buteco orgulhosamente recebe o crítico fodão Alex Gonçalves, do Cine Resenhas, para falar do melhor do cinema nacional em 2016. Apreciem sem moderação.

O tempo de polarização em que vivemos fez com que as atenções fossem concentradas em apenas dois filmes nacionais ao longo do ano. Dirigido por Kleber Mendonça Filho, Aquarius fez algo que a nossa cinematografia estava devendo, sendo a de gerar uma grande repercussão a nível mundial a partir de sua entrada ao seleto grupo de concorrentes à Palma de Ouro no Festival de Cannes, onde a equipe sustentou frases em sulfite A4 de que um golpe estava ocorrendo no Brasil.

Já no segundo semestre, o então discreto Pequeno Segredo, de David Schürmann, foi mostrando as suas garras assim que o boicote a Aquarius ganhou formas com liderança da oposição. A suspeita de influências negativas ao filme de Filho pode de fato ter se concretizado, pois foi Schürmann que teve a sua obra questionavelmente selecionada para representar o Brasil no Oscar 2017, chegando sequer entre os nove semifinalistas.

O resumo de toda essa novela é que, como se verá a seguir, Aquarius é mesmo o grande marco do ano em nosso cinema, mas isso não significa que a qualidade de outros filmes deve ser desconsiderada. A partir dessa reflexão, apresentamos um top 10 dos melhores filmes nacionais de 2016 em que a diversidade de gêneros, estilos e narrativas surge naturalmente.

#10 Através da Sombra, de Walter Lima Jr.
A visão de Walter Lima Jr. para o que é hoje uma história de terror tradicional é ousada, não poupando sequer a inocência das crianças, que às vezes insultam a sua protagonista com características sempre associadas à “mulher da vida” ou mesmo como agentes para provocar o seu recato, a exemplo do beijo que recebe de Antonio. Mesmo com forças ocultas se comunicando através de um copo ou de aparições aleatórias, a ameaça de Através da Sombra é quase material, dando todo um sentido a uma conclusão que soará abrupta para muitos.

https://www.youtube.com/watch?v=2YXgE59duGE

#9 Para Minha Amada Morta, de Aly Muritiba
Um dado inevitável nas análises sobre Para Minha Amada Morta vem a ser o fato de seu diretor, Aly Muritiba, ostentar em seu currículo a experiência como agente penitenciário. Foi na busca por uma evolução nesta função que teve acesso ao cinema, permitindo a si mesmo uma mudança profissional radical. É uma curiosidade que soma ao seu repertório, uma vez que não se desassocia do que testemunhou nas prisões ao criar a sua ficção, inclusive nesta sua estreia em longa-metragem. Melhor assim: estamos diante de um contador de histórias que confere verdade ao seu drama passional com pinceladas de thriller urbano.

#8 Mundo Cão, de Marcos Jorge
Com toques de thriller, Marcos Jorge conduz muito bem a tensão presente em seu texto assinado em parceria com Lusa Silvestre (de O Roubo da Taça), tirando proveito de um excelente elenco em que se destaca especialmente Adriana Esteves, impecável como a mãe desesperada para reencontrar o seu filho após testar os parcos recursos disponíveis. Mesmo entregando um terceiro ato sem a mesma alta voltagem dos anteriores, Mundo Cão não se furta de exibir um terreno que, mesmo literalmente pavimentado, traz as raízes de toda a nossa selvageria.

#7 O Escaravelho do Diabo, de Carlo Milani
Se o filme peca pela falta de imaginação de uma ou outra passagem e por um clímax apressado, não falta respeito a todo esse espírito da série Vaga-Lume, conseguindo render uma obra cinematográfica para os jovens sem se furtar da vulnerabilidade inerente ao seu universo. Há também um humor que se equilibra bem com certa brutalidade, bem como a nostalgia em ver personagens em uma ambientação contemporânea sem o inconveniente de dispositivos eletrônicos assumindo algum protagonismo. Que seja a primeira de muitas adaptações da série Vaga-Lume.

#6 Um Homem Só, de Cláudia Jouvin
A diretora e roteirista carioca Cláudia Jouvin tem um domínio de seu material não comprovado somente com as surpresas que prega para a segunda metade do filme, como ao não abrir nenhuma concessão no ato final. É como se Jouvin sustentasse o discurso de que não há mágica capaz de camuflar a nebulosidade de nossas escolhas. Um ceticismo em forma de um risco que vai fazer muita gente sair de cabeça baixa do cinema, mas que fortalece a nossa singularidade como indivíduos que não podem ser duplicados.