RetrospectivaButeco2014 #5 – 10 Principais Surpresas de 2014

NEM SEMPRE ENCONTRAMOS NOS CINEMAS aquilo que esperávamos. Lidar com expectativas cinematográficas é um flerte constante com a possibilidade de sair decepcionado. No entanto, como acontece no amor, qual é a graça de não se esperar absolutamente nada de um filme apenas pelo prazer de ser surpreendido? Será tão errado assim ficar ansioso por um lançamento e de repente descobrir que ele foi ainda melhor que o imaginado? Claro que não. Pensando exatamente nessas questões que convidamos o jornalista e crítico Marcelo Seabra (O Pipoqueiro) para a segunda edição da dobradinha de Principais Surpresas e Principais Decepções do Cinema em 2014.

Não deixe de participar comentando quais foram as grandes surpresas do cinema para você esse ano!

Nota do editor: A lista de Principais Surpresas e a lista de Principais Decepções são baseadas na opinião de dois críticos que foram ao cinema com expectativas prévias em relação aos filmes mencionados, e acabaram surpreendidos de uma maneira positiva ou negativa após assisti-los. De maneira alguma, as duas listas representam os “melhores” ou os “piores” filmes do ano, como parece que ficou subtendido nos comentários de alguns leitores que se queixaram das opiniões aqui apresentadas.

Top 5 – Principais Surpresas do Cinema em 2014, por Marcelo Seabra

Ao fazer os balanços de fim de ano, é sempre bom constatar que alguns filmes surpreenderam positivamente. Algo no projeto não fazia o público ter muita fé. Ou tudo, logo de cara, parecia muito errado. Se é possível fazer uma lista como a que segue, é porque alguém foi muito feliz em suas escolhas. E o primeiro a ser lembrado, de todo 2014, é James Gunn e seus Guardiões da Galáxia. A Marvel Studios vinha fazendo ótimas adaptações, sempre lembradas por serem o mais pé no chão possível. Aí, vem um grupo de não-heróis e manda tudo para o espaço, literalmente. Sem se levar a sério, mas não deixando de atentar para todos os detalhes, como a trilha sonora marcante e a riqueza de seus vários cenários, o filme conseguiu ser um sucesso de público e crítica e deu aquele reforço na carreira de seu protagonista, Chris Pratt, que enfrenta dinossauros em seu novo trabalho, o aguardado Jurassic World.

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No campo da ficção-científica com cara de videogame, Tom Cruise mais uma vez mostra que sabe fazer boas escolhas. Depois do eficiente Oblivion, mas com Guerra dos Mundos no currículo, o gosto do ator para o gênero parecia meio duvidoso. Mas, a exemplo de Minority Report, ele acertou novamente com No Limite do Amanhã, que balanceia ação, comédia e drama de forma exemplar. Cruise sabe escolher, ou formatar, um papel que lhe cabe como uma luva e defende bem o projeto. É invejável a energia que coloca em suas atuações. E o mais importante: o roteiro é construído sobre um mistério que altera a realidade, e as explicações sobre essa situação são bem plausíveis – dentro daquele universo. O resultado é entretenimento com lógica e boas atuações.

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Outra boa surpresa, também no campo da ficção-científica, e ainda proporcionando interessantes críticas, é a refilmagem de Robocop. Como na direção está o nosso José Padilha, era esperado que o estúdio pudesse tomar o filme para si e cuidar da edição final, como se queixa Heitor Dhalia de seu 12 Horas. Mas Padilha parece ter feito sua visão prevalecer, e foi corajoso o suficiente para tomar uma direção diferente da escolhida por Paul Verhoeven na recente versão original. Enfatizando o perigoso papel que a mídia vem tomando e o poder das grandes corporações, Robocop mostra que o futuro podre retratado na tela não está muito longe do que vivemos, e pode ser um triste presságio.

RoboCop

Com tantas asneiras feitas com base em brinquedos clássicos, como G.I. Joe e Batalha Naval, um filme sobre Lego não era nada excitante. Os roteiristas e diretores Phil Lord e Chris Miller, experientes tanto em comédias de animação quanto em live action, souberam aproveitar os recursos do brinquedo, montando e desmontando o que fosse necessário para que a trama caminhasse. Uma Aventura Lego é sobre um cara comum que será a chave contra o governo opressor, se prova a oportunidade perfeita para misturar diversos personagens do universo pop, e ajuda ter a gigante Warner Bros. por trás, já que ela é detentora de muitos direitos de uso. Assim, temos heróis como o Batman e o Superman com Han Solo e Chewbacca, o mago Gandalf, figuras históricas como Michelangelo, e parece não haver limite. Bem como na brincadeira de uma criança, que não precisa obedecer a regras ou lógica.

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O diretor e roteirista argentino Damián Szifrón escreveu seis histórias que retratam situações em que os personagens são levados a atos extremos conduzidos pela raiva. A costura dessas histórias, o longa Relatos Selvagens, não poderia ser mais atual, escancarando a estupidez que às vezes pode brotar de um cotidiano estressante ou de uma realidade massacrante. Encabeçando um ótimo elenco, Ricardo Darín protagoniza uma das histórias, e é até difícil dizer qual é a melhor, tamanho é o equilíbrio entre elas. Vingança é o tema recorrente e, se o diretor defende uma tese, é a de que violência gera mais violência. Mas sem se levar muito a sério, já que ele escancara a falta de noção dos envolvidos. Uma estreia discreta, produzida por nossos vizinhos, acabou se mostrando um dos filmes mais interessantes do ano.

surpresas - relatos selvagens

Top 5 – Principais Surpresas do Cinema em 2014, por Tullio Dias

Quando eu era moleque costumava ir para os fliperamas do BH Shopping, em Belo Horizonte (Dããã…), e colocava as moedinhas na máquina das Tartarugas Ninja. Na maioria das vezes, os valentões chegavam e tomavam o meu lugar, em outras eu avançava feliz com os tridentes do Raphael. Praticamente vinte anos depois dessas infelizes aventuras, foi anunciado um reboot completo da franquia nos cinemas. Ok. Disseram que Michael Bay estaria envolvido. Não tão “ok” assim. Boatos indicavam que as Tartarugas seriam alienígenas. Sinal de alerta ligado para a possível bomba cinematográfica que arruinaria os personagens para toda uma nova geração. No entanto, o longa-metragem de Jonathan Liebesman acertou na mão com aventura, ação e muito senso de humor (fazendo inclusive piadinhas com o fato de alguém ter pensado que as Tartarugas poderiam ser de outro planeta). Está longe de ser uma obra-prima, mas Tartarugas Ninja superou as piores expectativas e se revelou como uma grata surpresa.

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Com a lembrança das duas tentativas recentes de reinventar Branca de Neve para os cinemas (Branca de Neve e o Caçador e Espelho, Espelho Meu), seria difícil imaginar a remota possibilidade Malévola ser mais que uma oportunidade de admirar Angelina Jolie. Pois bem. Não é que eu estava enganado e a versão de A Bela Adormecida a partir da perspectiva da vilã Malévola conseguiu ser uma experiência positiva? Inclusive com diversos exercícios interessantes de linguagem, como as cores dos feitiços da personagem e a mudança nos tons do figurino.

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O cinema nacional brilhou com duas surpresas: o drama Entre Nós, que conta uma história de traições de confiança entre um grupo de amigos, e a comédia Homens São de Marte e é Pra Lá Que Eu Vou, que nos apresenta a busca desesperada de uma mulher para encontrar o seu grande amor. Enquanto o primeiro filme surpreende por sua frieza e ritmo envolvente, o segundo é exatamente o contrário e conquista o público pela sua simplicidade. Paulo Gustavo (que já havia conquistado a minha atenção com o hilário Minha Mãe é uma Peça no ano passado – numa recomendação de uma ex-namorada que vive em Niterói) nos diverte bastante, mas é a protagonista interpretada por Mônica Martelli quem transforma o filme num entretenimento de primeira, provando que até mesmo roteiros mais leves conseguem conquistar o público comum e os cinéfilos mais calejados e preconceituosos com as comédias produzidas no país.

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O principal problema das comédias é a barreira cultural que existe de um país para o outro. Tudo bem que no Brasil estamos bem acostumados com o comportamento norte-americano, mas ainda assim existem coisas muito características de cada cultura. Lá fora os adolescentes costumam morar nas universidades e abandonam seus lares, e a maioria de nós só acompanha isso através das inúmeras comédias sobre estudantes, de Porkys a American Pie. Ou seja, a bagagem nos deixa aptos a entender e rir de determinadas piadas pelo conhecimento prévio do que aquilo significa. Outro problema das comédias é a maior parte delas realmente não é engraçada. Por mais baixo que fique o seu Q.I. enquanto se sujeita a torturas cinematográficas que existem por aí, na maioria das vezes a gente não consegue rir. No entanto, Vizinhos chegou como uma grata surpresa para todos aqueles que possuem um conhecimento avançado em cultura pop, domínio da língua inglesa e compreensão do universo dos adolescentes de lá. Risadas garantidas do começo ao fim, quando a única coisa que eu esperava era ver Seth Rogen sendo ele mesmo.

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Pensei em incluir a comédia De Repente Pai, com o Vince Vaughn, mas não poderia deixar de me render ao surpreendente Guardiões da Galáxia. Quando a Marvel lançou Homem de Ferro, era uma aposta num personagem médio no universo da editora. Graça ao carisma de Downey Jr. e a qualidade do filme, óbvio, o resultado foi um sucesso e o estúdio está aí colhendo os frutos disso. Com Guardiões da Galáxia, a Marvel provou que qualquer herói merece se aventurar no cinema, desde que possua um elenco afiado e uma direção eficiente. Admito que nunca havia ouvido falar de Groot e seus amigos estranhos, mas saí do cinema com a sensação de que conheci os “heróis” mais divertidos do universo Marvel.

Groot Guardiões da Galáxia