Se tem alguém que pode berrar com produtores e ainda parecer o cara mais legal da sala, esse alguém é Samuel L. Jackson. Afinal, o homem sobreviveu a dinossauros, serpentes em aviões e até a Nick Fury nos Vingadores com um tapa-olho e zero paciência. Mas parece que um simples roteiro foi o que realmente testou os nervos do ator.
Durante uma entrevista com a Radio Free, Big Sam confessou que detestou o final do filme Lakeview Terrace (2008), aquele suspense morno dirigido por Neil LaBute — sim, o mesmo responsável pelo remake de O Sacrifício (2006), aquele onde Nicolas Cage grita “NOT THE BEES!” e todos nós morremos um pouco por dentro.
Em Lakeview Terrace, Jackson interpreta Abel Turner, um policial do LAPD que resolve transformar a vida de um casal interracial em um inferno digno de reality show trash. No fim do filme, Abel leva chumbo dos próprios colegas de farda depois de atirar no vizinho — cena que os produtores acharam o clímax perfeito. Jackson? Nem tanto.
“Foi uma puta discussão”, disparou o ator. “Eu não queria que ele morresse. Porque na vida real, policial protege policial… Eu ficava falando: ‘E se todo mundo fosse preso e, duas semanas depois, eles estivessem lá, regando o gramado, se encarando tipo ‘f***-se você’?’ Porque é assim que as coisas funcionam… Mas os produtores insistiam: ‘O público precisa ver o vilão morrer.’”
É, Sam. Infelizmente Hollywood ainda acha que o público só dorme tranquilo quando o “vilão” vai pro saco. Mesmo que isso signifique enfiar um final mastigado numa história que podia ter cutucado temas como racismo estrutural e corrupção policial com mais sutileza — mas preferiu passar pano com glitter.
E olha que o homem entende do riscado: já vestiu o distintivo em tudo quanto é produção. De SWAT (2003) a The Other Guys (2010), onde aparece por uns 90 segundos gloriosos antes de virar estatística. Mas morrer pelas mãos dos próprios colegas? Aí foi demais até pra ele.
Dá pra entender o incômodo. Jackson queria realismo sujo, aquele final agridoce que gruda na garganta. Mas o estúdio preferiu o combo fast-food emocional: vilão morto, herói aliviado, público em paz. Arte? Só se for arte de evitar controvérsia.
A ironia? Hoje, com toda a discussão global sobre brutalidade policial e impunidade institucional, o final alternativo proposto por Jackson soa menos como “licença poética” e mais como um espelho incômodo da realidade. Mas claro, melhor morrer e pagar o karma em cena do que provocar reflexões num thriller de médio orçamento. Prioridades, né?
No fim das contas, Lakeview Terrace acabou como mais um filme esquecível no currículo de um ator que já enfrentou o Lado Negro da Força, a máfia de Tarantino e um multiverso inteiro de vilões da Marvel. E ainda assim, sua batalha mais insana foi tentar convencer os produtores de que a vida real não se resolve com um bang-bang e fade out dramático.

