O CINEMA DE BUTECO ADVERTE: A crítica de Eu Sei O Que Vocês Fizeram no Verão Passado possui spoilers e deverá ser apreciada com moderação.
QUANDO PÂNICO CHEGOU AOS CINEMAS EM 1996, o subgênero slasher não vivia seu melhor momento. Wes Craven (diretor) e Kevin Williamson (roteirista) injetaram novo ânimo no público e de repente, todo mundo queria saber de filmes violentos de novo. Williamson foi malandro, aproveitou o momento e escreveu o script do que virou Eu Sei O Que Vocês Fizeram no Verão Passado, de Jim Gillespie. Era o recomeço das produções sangrentas.
De lá pra cá, bem, o subgênero slasher continua atraindo público e rendendo muita grana. São considerados “baratos”, cumprem as metas dos executivos e agradam fãs de todas as idades. Por isso, não foi nada surpreendente quando anunciaram um novo Pânico em 2022 — o longa ganhou ainda uma outra sequência no ano seguinte e tem outra agendada para 2026. Era questão de tempo até o pescador do gancho fatal retornar para o remake-reboot-continuação de Eu Sei O Que Vocês Fizeram no Verão Passado.
Vamos combinar uma coisa.
Vou chamar o longa apenas de Eu Sei. Esse nome imenso é chato de escrever toda hora e precisamos cuidar bem do nosso tempo de tela sem ler coisas inúteis.
A nova empreitada repete os passos de absolutamente toda franquia ressuscitada nos anos 2010, 2020. Recria o original sem pudor, como se fosse algo original. Como eu duvido que os adolescentes de hoje conhecem o filme de 1997, tá tudo bem. Logo no começo conhecemos os cinco protagonistas, um pouquinho de suas histórias para dar o contexto necessário e logo a bosta já tá feita: após causarem um acidente e jurarem não contar para a polícia, o grupo passa a ser aterrorizado um ano depois por cartas anônimas e um pescador assassino.
Há espaço para plantar uma crítica social relevante contra a gentrificação e poder financeiro. Os acontecimentos de 1997 são totalmente apagados porque eles fizeram os preços dos imóveis caírem muito. Quando um ricaço entra em cena comprando tudo por preço de banana (como os caras que compraram o Atlético), ele cuida para apagar os registros dos assassinatos da internet e jornais. No entanto, esse pano de fundo é explorado de forma superficial, o que é ótimo. O tom escolhido pelo roteiro é pura galhofa e não combinaria com uma premissa mais séria.
Esse novo Eu Sei não parece ter muito compromisso com o bom-senso. Talvez seja por isso que gostei. Algumas subtramas e personagens surgem para serem descartados, é difícil entender a evolução do relacionamento amoroso da protagonista Ava, as decisões são um pouco “que porra é essa que esses jovens estão fazendo?”, no entanto, não é como se fossem situações totalmente afastadas da lógica interna desse universo. Enquanto os dois primeiros tentavam ser cafonas dentro de uma narrativa quase-plausível (exceto pelos caranguejos no porta-mala desaparecendo sem deixar rastros ou cheiro, obviamente), essa produção só se importa em seguir em frente.
Quando um filme de terror me faz rir, não por ser ridículo, mas por abraçar o ridículo, eu fico feliz. Os exageros e absurdos são divertidos. A participação especial de Sarah Michelle Gellar é um belo exemplo. É uma sequência de pesadelo engraçada dentro do que é possível. Mais que isso, é um presente para os fãs com uma referência explícita que não fica apenas nos diálogos ou fotos. Outra referência discreta? Um pedaço do barco de Ray (Freddie Prinze Jr.) aparece como decoração do seu bar. Quer mais uma? Jim Gillespie, diretor do longa de 1997, tem seu nome citado por um personagem em uma parte aleatória.
O mais legal de produções como Eu Sei e Pânico é o jogo de descobrir quem é o assassino da vez. Aqui podemos discutir e apontar um golpe baixo do roteiro, que insinua e direciona tudo para um determinado personagem religioso (lembrei do Patrick Swayze em Donnie Darko), mas revela que o perigo estava mais próximo do que pensávamos. Ver Stevie como assassina nem foi um incômodo, mas Ray virar um matador foi o tiro de bazuca que o roteiro precisava dar para deixar sua mensagem: “A gente quer se divertir e zoar com esses personagens mesmo.”.
Uma verdade precisa ser dita. Os filmes slashers talvez ainda não saibam lidar bem com o uso de telefones celulares. Mesmo que o roteiro de Eu Sei tome licenças poéticas para construir suas mortes, soa um pouco forçado quando os personagens parecem esquecer dos seus smartphones.
Eu Sei O Que Vocês Fizeram no Verão Passado está longe de aparecer entre os dez melhores filmes de terror de 2025, mas não significa que seja um fiasco. Buscando criar sua nova identidade e trabalhando um humor ácido com protagonistas femininas carismáticas, deixo meus votos de confiança para a diretora/roteirista Jennifer Kaytin Robinson. Que venha logo a continuação com o retorno de Stevie.

