Review The Threesome: ménage com boleto e reproduções inesperadas

Se comédia romântica fosse honesta, ela começaria com um aviso na tela: “seu desejo não vem com manual, só com consequências”. The Threesome pega uma fantasia de bar universitário e arrasta para a vida adulta como quem puxa alguém pela gola da camisa: um trio improvisado, uma ressaca moral e… duas gravidezes (sim, o roteiro tem a audácia de dobrar a aposta). A premissa parece saída daquela era em que Hollywood confundia “sexo” com “gritaria” e “piada” com “grosseria”, mas aqui a pegada é outra: é uma romcom calibradinha, esperta, com personagens que reagem como gente de verdade — isto é, gente confusa, insegura e otimista o suficiente para achar que dá pra resolver tudo conversando.

Dirigido por Chad Hartigan (Morris from America, Little Fish) e escrito por Ethan Ogilby, o filme acompanha Connor (Jonah Hauer-King), o tipo de cara que parece ter sido desenhado por algoritmo de “namorado gentil”: olhos de filhote, sorriso de pedido de desculpa e aquela energia de “eu não queria causar, mas causei”. Ele sempre foi a fim de Olivia (Zoey Deutch), que entra em cena com armadura emocional e um humor pontudo — tough cookie com medo de sentir qualquer coisa que não possa ser controlada. Jenny (Ruby Cruz) é a terceira ponta do triângulo, a figura que chega como “acidente narrativo” e vira o centro gravitacional quando o filme decide que maturidade não nasce do amor, nasce do caos. O trio se forma numa noite de bebida e impulsividade e, quando a fantasia termina, o que sobra é uma equação afetiva com prazo, ultrassom e uma pilha de perguntas que ninguém queria responder.

O grande acerto de The Threesome é entender que a comédia não está no sexo (o filme é sexy sem ser explícito e sem virar vitrine), mas no desespero organizado que vem depois: o “como a gente faz isso dar certo?” que começa romântico e vira administrativo. A crítica do Guardian chamou de “impecavelmente calibrado”, e é uma boa descrição: o roteiro joga reviravoltas plausíveis, faz curvas loucas sem quebrar a suspensão de descrença, e mantém o espectador preso por uma razão simples — você quer que dê certo para todo mundo, mesmo sabendo que “dar certo” talvez não exista nessa configuração.

Zoey Deutch é o motor do filme. Ela tem uma habilidade rara de fazer personagem espinhosa parecer humana antes de parecer “legal”. Olivia fala rápido, corta mais rápido ainda, mas a Deutch vai descascando camadas de defesa até aparecer a vulnerabilidade. E o mais interessante: o filme não pune a personagem por não ser “doce”. Ele mostra que a dureza é uma estratégia — e que estratégia cansa. Hauer-King, por outro lado, faz um protagonista masculino que não tenta “dominar” a narrativa com charme de macho alfa. Ele é um romântico ansioso, e isso refresca o gênero: pela primeira vez em muito tempo, o “cara bonzinho” não é só um prêmio, é um problema ambulante tentando ser responsável.

Ruby Cruz é quem pega a parte mais ingrata: Jenny poderia facilmente cair na gaveta da “terceira pessoa funcional”, aquela que existe para complicar o casal principal. Mas Cruz dá dignidade e uma teimosia quieta à personagem — ela não vira obstáculo, vira alguém tentando não ser apagada. E esse é o pulo do gato: The Threesome é uma romcom em que o triângulo não é um jogo de “quem vence”; é um estudo de danos colaterais e responsabilidades cruzadas. O elenco de apoio entra como tempero (tem Josh Segarra funcionando como o canalha perfeito em miniatura) sem roubar o foco do núcleo central.

The Threesome é uma comédia romântica muito bem comportada… para um filme chamado The Threesome. Ele flerta com a ousadia, mas evita o abismo. A escrita é cheia daquele “rat-a-tat” de sitcom 90s e screwball clássico — divertido, afiado, só que ninguém fala assim na vida real a menos que esteja tentando vencer discussão no X. Isso pode te tirar do filme se você busca naturalismo; por outro lado, se você aceita o acordo de comédia (“aqui as frases vêm com punchline embutida”), funciona como música: é ritmo, é cadência, é química.

O que sobra é uma raridade de 2025: romcom que não tem vergonha de ser romcom, mas também não trata seus personagens como bonecos. Ela entrega risada, entrega sentimento e entrega aquele desconforto adulto de perceber que escolhas impulsivas têm CPF. Se você quer uma comédia romântica que pareça contemporânea sem virar “palestra sobre relacionamentos”, aqui está: três é o número mágico — até a conta chegar.