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Review Desconhecidos: Um Tarantino com TPM e uma seringa de adrenalina

No jogo do gato e rato entre clichê e reinvenção, Desconhecidos pula a cerca e volta com sangue nos dentes. O filme dirigido por JT Mollner é aquele tipo de surpresa que você não viu chegando e que, no fim, te deixa rindo nervoso, questionando suas próprias expectativas narrativas e, talvez, seu gosto por cereais matinais cobertos de sangue.

A premissa? Dois estranhos em uma estrada no Oregon. Ele, um tipo com cara de quem foi expulso de um clube de incels por excesso de intensidade (Kyle Gallner). Ela, uma mulher em fuga que você pensa que precisa ser salva, mas que provavelmente te desmontaria com um olhar (Willa Fitzgerald, em modo “final girl meets femme fatale meets sociopata funcional”). O que começa como um flerte tenso com a velha fórmula do assassino perseguidor logo vira um quebra-cabeça narrativo que embaralha o tempo, os gêneros e sua sanidade.

Filmado inteiramente em 35mm (e claro, faz questão de te avisar disso logo no início, porque sutilidade não é a praia aqui), o longa é lindo de doer. Giovanni Ribisi, sim, o ator de Avatar e Friends, assume a direção de fotografia com um entusiasmo que beira o fetichismo. Cada enquadramento parece saído de um vinil do Fleetwood Mac depois de uma briga feia.

A estrutura à la Pulp Fiction começa com o “Capítulo 3” e vai voltando, indo, parando, correndo, te deixando tonto como se tivesse tomado um soco com uma câmera Super 8. A influência de Tarantino está escancarada, mas é como se ele tivesse misturado os roteiros com um pouco de sonífero e entregado para uma versão emo do Sam Raimi.

O grande trunfo aqui é Willa Fitzgerald. Ela carrega o filme com uma presença que varia entre o desespero e a dominação plena. Sua performance é uma aula de como ser carismática, perigosa e tragicômica ao mesmo tempo. Ela é uma mulher em guerra, não apenas contra o assassino, mas contra o clichê da donzela em perigo que o cinema empurra desde o rolo 1.

Ah, e não podemos esquecer dos coadjuvantes que parecem ter sido pescados diretamente de uma série B dos anos 70: Ed Begley Jr. e Barbara Hershey interpretam hippies aposentados que servem café, conselhos espirituais e possivelmente cogumelos. Eles são a pitada exata de humor involuntário que transforma o thriller em quase uma comédia de horror metafísica.

Desconhecidos é, acima de tudo, uma brincadeira narrativa com sangue e batom. Um filme que tropeça de forma consciente, que te provoca a tirar conclusões para depois puxar o tapete e rir da sua cara. Pode ser acusado de estiloso demais? Sim. De metido a esperto? Com certeza. Mas é também afiado, divertido, sangrento e absurdamente bem atuado.

No fim das contas, JT Mollner pode até não ter reinventado a roda, mas ele com certeza meteu fogo nela, jogou no meio da floresta e filmou tudo com lente analógica. E sinceramente? Eu adorei assistir ao incêndio.