Depois de quase três décadas pulando de aviões, escalando prédios e desafiando a morte com o mesmo entusiasmo de quem pede um expresso duplo, Tom Cruise retorna como Ethan Hunt para sua última missão — ao menos até que a aposentadoria pareça tediosa demais. Missão: Impossível – O Acerto Final (Mission: Impossible – The Final Reckoning) chega como o oitavo capítulo de uma das franquias de ação mais consistentes de Hollywood, mas entrega um filme que parece tão dividido quanto seu título sugere: um épico megalomaníaco que começa como um PowerPoint de retrospectiva e termina como um balé vertiginoso de acrobacias aéreas, explosões e suor heroico.
A primeira hora do filme, infelizmente, é um tropeço feio. Em vez de nos lançar em uma sequência de ação logo de cara — uma tradição quase sagrada da saga — o diretor Christopher McQuarrie opta por um longo e pretensioso flashback-recapitulativo. Ao tentar elevar Ethan Hunt ao status de mito, o roteiro exagera na reverência e entrega uma introdução que parece um “Previously on Mission: Impossible” com overdose de seriedade. O resultado? Um início arrastado, expositivo e com pouca da sagacidade que sempre foi marca registrada da série. É como se o filme estivesse mais preocupado em explicar por que Ethan é importante do que em mostrar por que ele ainda é relevante.
Mas se Acerto Final tropeça na largada, compensa com uma segunda metade que acelera sem olhar para trás. Assim que Hunt volta à ativa para enfrentar “A Entidade” — uma IA onipotente e sorrateira que ameaça a ordem mundial com desinformação, deepfakes e manipulação digital — a engrenagem da ação finalmente gira. Com o reforço de velhos conhecidos como Luther (Ving Rhames), Benji (Simon Pegg) e Grace (Hayley Atwell), e novos rostos como Paris (Pom Klementieff) e o carismático capitão Bledsoe (Tramell Tillman, da série Severance), o filme começa a se parecer com o que o público veio buscar: ação pura, cenas de tirar o fôlego e Cruise desafiando os limites da física — e da sanidade.
A trama é simples: impedir que a tal Entidade controle tudo. Só que o caminho até lá é pavimentado com tiroteios em submarinos, perseguições em aviões, conspirações governamentais e reviravoltas que fazem até o relógio da bomba parecer indeciso. Tudo isso enquanto Ethan precisa unir duas metades de uma chave cruciforme (que parece saída de um Resident Evil) e mergulhar em um submarino russo para destruí-la.
Há momentos em que Acerto Final beira a paródia de si mesmo — e talvez seja essa a intenção. A seriedade com que a ameaça da IA é tratada parece um comentário sobre o estado atual do mundo, mas também uma piscadela para o espectador: Sim, é tudo exagerado. Mas você está se divertindo, não está? E de fato, quando o filme se entrega à ação, é um espetáculo. A sequência aérea final, com Cruise pendurado em um avião de hélice em pleno azul celestial, é de fazer qualquer fã do cinema de ação sair do assento — nem que seja para respirar fundo.
Visualmente, o filme é deslumbrante, especialmente em IMAX. O momento em que Ethan gira uma válvula num submarino e a tela se expande é um gesto metalinguístico brilhante: Cruise literalmente abre a imagem para nos lembrar de que o cinema ainda pode (e deve) ser uma experiência sensorial. Darius Khondji, responsável pela fotografia, e o editor Lucian Johnston ajudam a transformar o caos narrativo em um balé de ritmo e adrenalina.
Ainda assim, não dá para ignorar os problemas. A ausência do humor autorreferente dos filmes anteriores pesa. A leveza, o senso de “estamos todos nessa juntos” que permeava as aventuras de Ethan, parece ter sido substituído por uma solenidade que não combina com a essência da franquia. O vilão Gabriel (Esai Morales), apesar da ameaça digital representada pela Entidade, carece de carisma, e a motivação central soa mais como desculpa para acrobacias do que como drama genuíno.
No fim das contas, Missão: Impossível – O Acerto Final é o fim de uma era com gosto agridoce. Um épico de ação que oscila entre a reverência exagerada e o espetáculo absoluto. Se não é a despedida perfeita que a franquia merecia, ao menos é um lembrete poderoso de tudo o que Cruise e sua equipe construíram: um cinema físico, suado, real — e que ainda sabe como nos deixar de boca aberta.

