DEXTER RESSURREIÇÃO

Review Dexter: Ressurreição: Dexter voltou dos mortos… e trouxe o facão

Dexter Morgan morreu. Quer dizer… morreu igual personagem de novela das oito: levou tiro no peito, caiu no chão, a câmera se afastou… mas ninguém viu o velório. E se não tem velório, meu amigo, tem brecha pra spin-off, reboot, revival, prequel, fanfic, ou no caso aqui, resurreição. A série da Showtime, agora na Paramount+, ressuscita seu serial killer favorito de um jeito tão desavergonhado quanto viciante. Dexter: Resurrection não apenas ignora a lógica médica como esfrega um bisturi sujo de ironia na nossa cara e diz: “Aceita, otário, ele voltou.”

E voltou com tudo.

Morgan Freeman que me perdoe, mas só Michael C. Hall consegue narrar absurdos internos com tanta serenidade de monge tibetano e cara de quem vai te desmembrar com carinho. A performance dele continua sendo o eixo moral — e imoral — de toda essa bagunça ética. O cara acorda de um coma de 10 semanas (sim, DEZ SEMANAS), depois de levar um tiro no peito do próprio filho (pai presente é outra coisa), e já volta filosofando sobre o Código de Harry como se fosse coach de LinkedIn.

Sim, o Harry também voltou. Mais morto do que nunca e mais sábio que antes, a versão espectral do papai Remar flutua pelos episódios como consciência de ressaca — o tipo de voz que diz “vamos matar só quem merece” e faz isso parecer espiritualmente elevado.

A trama agora se muda pra Nova York, porque, né, Iron Lake era tão 2021. E se Miami era calorosa e sensual (e cheia de plásticos), NYC aqui é sombria, úmida, claustrofóbica e cheia de crimes criativos — tipo o pesadelo de um roteirista fã de Se7en e Law & Order ao mesmo tempo. Dexter fica na espreita, como um Batman sem gadgets e com habilidades sociais de um gato selvagem. Enquanto isso, Harrison trabalha num hotel chique, tentando fingir que é normal. Spoiler: não consegue. Ele tá a um surto de distância de virar o novo Dexter — só que com mais daddy issues que um episódio de Euphoria.

A série se dá ao luxo de ter um elenco de convidados tão estelar que faria Big Little Lies parecer web-série da FAP. Temos Uma Thurman (finalmente de volta ao sangue), Peter Dinklage (sendo brilhante como sempre), Krysten Ritter (toda trevosa), Eric Stonestreet (WTF?), e Neil Patrick Harris (que em todo universo alternativo sempre aparece). David Dastmalchian surge como vilão com cara de quem já nasce com o CPF cancelado. E David Zayas retorna como Angel Batista, porque toda série precisa de um policial que junta as peças tarde demais.

Visualmente, Dexter: Resurrection é um deleite para quem gosta de atmosfera. Os corredores do hotel onde Harrison trabalha parecem ter sido projetados por um designer de interiores deprimido. As cores são lindas — dourado, marrom, verde-oliva — mas todas evocam morte, culpa, sangue coagulado e aquela sensação de que a qualquer momento alguém vai tropeçar num corpo plastificado.

O roteiro? Bem, o roteiro é esperto o suficiente pra não se levar a sério demais. Ele abraça o absurdo, beija na boca do clichê e sai correndo pra fazer algo inventivo. Há episódios que parecem retirados de um pesadelo com direção de arte premiada. Tem uma sequência no episódio 4 que beira o surrealismo gore. Tipo, se Salvador Dalí assistisse Bates Motel sob efeito de cogumelos, ele escreveria isso.

A trilha sonora também merece aplausos: Nick Cave, The Strokes, e umas joias escondidas que dão aquele tom “estou matando alguém, mas com estilo”.

E claro, nada disso funcionaria sem Hall, que continua sendo o elo entre o grotesco e o poético. Dexter é o tipo de personagem que a gente ama odiar, torce pra escapar, e ao mesmo tempo quer manter longe da família. Ele é um justiceiro dos nossos instintos mais primitivos. Quando ele entra em ação, dá até vontade de perdoar os absurdos do roteiro. Afinal, essa é uma série onde o protagonista pode sim sobreviver a um tiro no peito, sumir por meses e reaparecer com cabelo bem penteado e uma nova identidade. E a gente assiste feliz.

Dexter: Resurrection é um presente envenenado para quem se frustrou com o final de New Blood. É um “foi mal aí, vamos tentar de novo” com mais sangue, mais estilo e um toque quase poético de insanidade. Não é perfeito — algumas reviravoltas ainda desafiam a lógica e o bom senso — mas é deliciosamente coerente com a mitologia da série.

Você pode não acreditar em ressurreição, mas quando o Dexter volta, até a gente finge que acredita.