O primeiro semestre de 2025 foi marcado por grandes estreias que conquistaram o público e a crítica. Entre blockbusters impactantes e produções mais intimistas, alguns filmes se destacaram e garantiram seu lugar na memória dos cinéfilos. Reunindo diferentes gêneros e estilos, os membros do Cinema de Buteco selecionaram os melhores filmes lançados até agora no ano. Confira os destaques que fizeram a diferença nas telonas em 2025.
Escolhas da Graciela Paciência
Pecadores – O que um filme novo de vampiro poderia acrescentar em 2025? Pois é, talvez não muita coisa, mas a verdade é que Pecadores não se trata de um filme de vampiros, é algo que vai muito além. O filme de Ryan Coogler explora a ancestralidade, música, racismo e outros assuntos através de dois gêmeos interpretados por Michael B. Jordan. Quando eles voltam à cidade que abandonaram há anos, são cercados pelo racismo em diferentes formas de manifestação.
Pecadores é um daqueles filmes que não se pode ficar em uma única prateleira, tamanha a sua riqueza de discussões e reflexões. Seus coadjuvantes agregam diferentes camadas à história e as personagens femininas não estão no filme para atuarem como escadas para os protagonistas, mas para colocar mais profundidade e diferentes pontos de vista à trama.
A Garota da Agulha – O terror tem muitas formas e, em uma guerra, sua capacidade de metamorfose aumenta de maneira assustadora. A Garota da Agulha consegue expor o medo que permeia os pensamentos femininos, como se ver grávida e desamparada dentro de uma comunidade que não dá a mínima para os seus problemas e elevar isso com a crueldade humana a níveis extraordinários.
O filme de Magnus von Horn oferece ao espectador um mergulho no clima melancólico da Primeira Guerra Mundial, com falta de perspectiva e a intenção de sobreviver um dia de cada vez. Mas Karoline (Victoria Carmen Sonne) descobre que a perversidade nem sempre carrega um fuzil ou atira bombas, mas sempre consegue extrair o pior do ser humano.
Conclave – Um dos rituais sagrados da igreja católica, o conclave (a escolha de um novo líder, o Papa) é cheio de peculiaridades e, no filme de Edward Berger, o espectador é jogado a uma trama cheia de reviravoltas. Falando assim, parece o básico do que todo filme tem que fazer, mas não é bem assim.
Conclave consegue manter as particularidades da tradição e da crença católica enquanto destrincha diversas camadas em uma só história. É de se pensar que, considerando o ambiente em que o filme se passa, o conceito de individualidade seja quase inexistente, mas o espectador percebe o engano quando se vê diante de perfis tão distintos disputando um cargo tão importante. A tensão que o filme provoca não distingue crenças e chega a todos que se dispõem a se surpreender.
Homem com H – Os desafios de uma cinebiografia musical não são poucos. Os fãs do artista buscam ver na tela algo que, muitas vezes, não coincide com o que os músicos querem que seja visto na tela, enquanto o cineasta precisa se desdobrar para conceber uma obra que faça justiça à arte do músico, agrade aos fãs e ainda atraia o público cinéfilo.
Esmir Filho conseguiu realizar tudo isso de maneira espetacular. Ao contar a história de Ney Matogrosso, ele se mostrou um cineasta competente, caprichoso e dedicado. Jesuíta Barbosa mostra por que é um dos grandes atores de sua geração e encarna Ney incrivelmente. Homem com H não tenta amenizar nada e mostra as dificuldades e o preconceito enfrentados pelo artista, as perdas que ele sofreu ao longo da vida e o processo de se entender, se respeitar e se reinventar como músico.
Sing Sing – É no mínimo curioso perceber que o cinema, uma arte que abraça histórias de diversos segmentos, alcança números astronômicos de bilheteria com narrativas de fantasia e, ao mesmo tempo, se mostra munido de tanta sensibilidade ao revelar as particularidades de histórias vividas por pessoas invisibilizadas diariamente.
Em Sing Sing, acompanhamos Divine G (Colman Domingo, em uma atuação brilhante), um homem que cumpre pena por um crime que não cometeu e, na prisão, encontra um novo propósito no teatro. Entre tantos fatores emocionantes no filme, se destaca a percepção de que cada ser humano pode ter o seu potencial descoberto de maneira aleatória e que todo mundo pode sonhar. Ainda assim, o longa não cai na armadilha da pieguice e mantém os pés nos chão.
Meu Nome é Maria – Imagine só, uma jovem e promissora atriz, nos anos 1970, ter a oportunidade de trabalhar com um dos atores mais famosos, respeitados e reverenciados da história do cinema e com um cineasta que, apesar de ainda não ter chegado ao ápice da carreira, estava trilhando um bom caminho.
Sonho de quase qualquer garota, certo? Para Maria Schneider, isso se tornou um pesadelo. A violência sofrida (e filmada) durante a gravação de Último Tango em Paris foi “somente” o primeiro desrespeito que ela viria a sofrer ao longo de anos. Na tela, a cineasta Jessica Palud trata do assunto com respeito à Schneider e muita sensibilidade, enquanto Anamaria Vartolomei entrega uma interpretação à altura complexidade da atriz.
Escolhas do Marcelo Seabra
A Verdadeira Dor – Jesse Eisenberg faz um filme menor e mais pessoal, explorando suas origens e criando ao menos um personagem memorável, que deu o Oscar a Kieran Culkin: um primo que fica ótimo no filme, mas seria insuportável de ter por perto.
Um Completo Desconhecido – Com a sábia decisão de retratar um momento bem específico, ao invés de tentar abraçar uma vida, o longa mostra um Bob Dylan muito próximo do que ele devia de fato ser: Thimothée Chalamet não abranda o lado babaca do música, mostrando que o foco dele ao chegar em Nova York era ficar famoso, mesmo que tivesse que usar algumas pessoas no processo.

Better Man: A História de Robbie Williams – Usando uma metáfora que pode ter vários significados, o cantor Robbie Williams conta sua história se colocando como um macaco e buscando não se eximir de nada, como alguém que segue humilde em sua jornada evolutiva, e sua vida de fato tem passagens interessantes.

Desconhecidos – Strange Darling – Com dois atores desconhecidos do grande público – Willa Fitzgerald esteve em Reacher e A Queda da Casa de Usher, enquanto Kyle Gallner chamou a atenção recentemente em Sorria, dentre muitos outros – o diretor e roteirista JT Mollner aposta novamente numa inversão de papéis com muita violência, como em seu filme de estreia, Criminosos e Anjos.
Escolhas da Maristela Bretas
Ainda Estou Aqui – Grande produção nacional, merecedora de todos os prêmios (pena que faltaram os Oscars de Melhor Filme e Melhor Atriz. Abordando um sombrio período o Brasil, o longa foca na luta de Eunice Paiva em encontrar seu marido, o deputado Rubens Paiva levado pelas forças da Ditadura Militar. Fiel ao livro, ótima reprodução de época, além da brilhante atuação de Fernanda Torres como a protagonista.
Conclave – Não recebeu o devido reconhecimento, o filme que conta com Ralph Fiennes retrata o processo de eleição de um novo papa e os bastidores do Vaticano durante o processo. Fiennes entrega uma interpretação digna de prêmios, além do figurino e maquiagem, com uma ótima reviravolta no final.
Chico Bento e a Goiabeira Maraviósa – Isaac Amendoim nasceu para ser Chico Bento, uma escolha acertadíssima. O garoto tem carisma, simpatia e incorporou o personagem. A história do famoso personagem de Maurício de Sousa que tenta impedir a derrubada de sua preciosa goiabeira encanta crianças e adultos.
Vitória – Ninguém menos que a diva Fernanda Montenegro para protagonizar Vitória, uma moradora de Copacabana que convive diariamente com a droga, prostituição e exploração infantil em frente a sua janela. E é esta senhora que enfrenta os traficantes, filmando tudo e dando início a uma batalha para denunciar a criminalidade. Excelente produção.
Pecadores – O diretor Ryan Cooper foi um mestre ao dirigir Michael B. Jordan em papel duplo neste longa, ambientado numa comunidade negra do Mississipi que luta contra o racismo e a segregação racial e ainda terá que enfrentar outra força demoníaca. A trama é embalada por uma empolgante trilha sonora de blues.
Lilo & Stitch (live-action) – Quem gostou da animação de 2002 da Disney não vai se decepcionar com o live-action. O filme tem simpatia, emoção e segue a risca a história do alienígena batizado Stitch, que cai na Terra e é adotado pela espevitada Lilo. E essa amizade vai mudar a vida da dupla e de todos a seu redor, criando laços de uma verdadeira família.
Como Treinar o seu Dragão (live-action) – Outra que acertou milimetricamente no remake de uma animação de sucesso do passado foi a DreamWorks ao lançar seu primeiro live-action, “Como Treinar o Seu Dragão”. Banguela, novamente é a estrela e está ainda mais fofo, formando uma parceria cativante com soluço, interpretado por Mason Thames. O jovem está muito bem e os fãs da franquia não irão se decepcionar.
Escolhas do Rafael Ferraz
Oeste Outra Vez – Um western à brasileira. Reimagina o sertão como território mítico e político, onde a poeira guarda os fantasmas do país. É cinema de invenção e memória, que sangra com elegância.
Manas – Na Ilha do Marajó, uma garota de 13 anos enfrenta o ciclo da violência com coragem e raiva. Um retrato sem concessões da infância encurralada, filmado com delicadeza e fúria.
Pecadores – O blues pulsa como memória viva, e os vampiros, aqui, não são apenas mitos: são metáfora para os ciclos de expropriação que drenam a cultura negra.
Extermínio: A Evolução – Danny Boyle vira o jogo. Se antes havia brutalidade realista, agora há exagero estilizado. Um apocalipse com zumbis míticos. O camp toma forma.
Bituca – O documentário mais suave e grandioso do ano. Não tenta dissecar Milton Nascimento, prefere tocá-lo com a delicadeza de quem escuta uma canção antiga no fim da tarde. Cinema que acolhe.
Escolhas do Marcos Tadeu
Pecadores – Consagra-se como um dos melhores filmes ao trazer uma narrativa potente que conecta passado e presente da população negra. A trama bebe do blues e do jazz para refletir sobre as relações raciais, oferecendo uma experiência sensível e provocadora.
Mickey 17 – O novo trabalho do diretor de Parasita, apresenta uma ficção científica densa que discute clonagem, pertencimento e a função do indivíduo na sociedade, ampliando os debates éticos e existenciais que marcam sua filmografia. Daemon City segue um caminho mais direto, com uma história de vingança simples, mas eficaz, onde a dor da perda leva os personagens a atitudes extremas. É um longa recheado de ação e sangue, voltado ao público que busca adrenalina. Em um contraste instigante, Sobreviventes, coprodução entre Brasil e Portugal, inverte a lógica histórica da escravidão ao mostrar um futuro onde negros escravizam brancos para sobreviver. A proposta ousada gera reflexões sobre poder, história e humanidade.
Homem com H – Na seara das cinebiografias, Homem com H é um acerto. O filme comprova que boas biografias se constroem com roteiro afiado, direção sensível e grandes atuações. Jesuíta Barbosa incorpora Ney Matogrosso com intensidade, revelando sua relação conturbada com o pai e o uso da arte como forma de grito e pertencimento. Bailarina – O filme é um verdadeiro “John Wick de saia”. A protagonista mata mais do que o próprio Baba Yaga e entrega ótimas cenas de ação, com potencial para gerar uma franquia sólida.
Como Treinar o Seu Dragão (live-action) – No campo das adaptações, Como Treinar o Seu Dragão mostra que é possível fazer um live-action fiel sem ser cansativo. A produção caprichada nos efeitos visuais e especiais torna o filme envolvente para todas as idades.
F1 – O Filme – O longa aposta na fórmula de Top Gun: Maverick, combinando um roteiro esperto com cenas eletrizantes. Brad Pitt vive um piloto veterano, e o público é lançado diretamente dentro das corridas em uma experiência imersiva.
A Garota da Agulha – O longa de terror se destaca por sua abordagem forte e impactante sobre a maternidade. É um drama que toca fundo, sem recorrer a clichês, entregando uma narrativa visceral e necessária.
Escolhas do Filipe Rodrigues
Homem Com H – Apesar de algumas transições cronológicas pouco inspiradas e a falta em delinear melhor uma ou outra época específica, a cinebiografia de Ney Matogrosso tem pura essência do artista, e assim como o próprio, tem várias facetas. É brilhante, é sombria, é crua, é suave, e principalmente, acerta muito em criar um retrato desse ser que desafiou o tempo e o espaço sem estar disposto a negociar sua liberdade com um mundo que a reprova. Achei inspirador, achei honesto. E palmas para a direção de arte espetacular!
Pecadores – Ao falar de ancestralidade e conflitos raciais, Ryan Coogler não se contenta com representatividade rasa, e faz até mesmo clichês vampirescos se curvarem à forma autêntica com que ele decide abordar essa história. Pecadores é um terror/fantasia de vampiros nos anos 30 com propósito, regado a blues, e com um dos plano-sequências mais legais e inspirados que eu já vi em um filme. Adorei!
Mickey 17 – Mickey 17 é um autêntico filme hollywoodiano do Bong Joon Ho, e provavelmente por isso ele pareça mais estranho do que boa parte dos sci-fi hollywoodianos de medio/alto orçamento que se vê atualmente. Apesar de ser um bocado inflado de temas, eu gostei da sátira sobre precarização das condições de trabalho, o valor do indivíduo na sociedade e a exploração violenta feita pra sustentar glamour e futilidade de gente rica. E o final good vibes me fez sair do cinema com uma sensação boa.
Memórias de Um Caracol – Essa animação é a definição de montanha russa emocional. Uma história sobre prisões, as que são impostas e as que criamos pra nós mesmos. Mas também é sobre criar laços, manter vínculos, sobre reunir forças pra enfim quebrar a concha e existir de forma honesta, realizar sonhos… Complexo, bonito e melancólico de um jeito que me surpreendeu.

